Quadruplicou o número de alunos com aulas em casa

28-11-2014 | Catarina Dias

Álvaro Ribeiro é professor do Instituto de Educação da UMinho

A maioria dos pais que adota este método de ensino tem formação superior. (foto: http://comofas.com/como-estudar-em-casa)

John Taylor Gatto é um dos principais críticos do sistema escolar convencional (foto: www.educationrevolution.org)

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Em Portugal, as famílias que optam pelo ensino doméstico e individual são cada vez mais. E as notas de Português e Matemática costumam ser superiores à média nacional, diz Álvaro Ribeiro




O número de crianças e jovens que têm aulas em casa quadruplicou nos últimos quatro anos. Já são cerca de 350 alunos, sendo a maioria da Grande Lisboa e filhos de pais com formação superior. Com legislação desde 1977, Portugal é um dos países europeus onde o ensino doméstico é mais liberal, juntamente com o Reino Unido, Dinamarca, Finlândia e Rússia. Quem diria?
 
De acordo com a legislação atual, é possível ter aulas em casa, dadas pelos pais e professores (ensino doméstico) ou apenas por explicadores particulares (ensino individual). A lei obriga apenas a que as crianças e jovens sejam matriculados numa escola, onde poderão realizar provas escritas no final de cada ciclo.
 
“As famílias que praticam ensino doméstico acreditam que podem oferecer um projeto educativo diferente da ‘escola pública’, com mais e melhores experiências de aprendizagem, métodos de ensino e respeitando as necessidades específicas das crianças”, afirma Álvaro Ribeiro, professor convidado do Instituto de Educação da UMinho e autor da tese de doutoramento “O Ensino Doméstico em Portugal”, que será brevemente defendida. Os motivos apresentados pelos pais prendem-se com o facto de estes desejarem acompanhar adequadamente o desenvolvimento dos seus filhos, aumentar a qualidade da vida familiar e "promover um conceito diferente" do que é ser criança. Revelam preocupações quanto à segurança escolar, à qualidade do ensino e do “currículo estandardizado”, bem como à pressão dos pares relativamente às relações de género, drogas, sexo e álcool. 
 
Para algumas famílias, exemplifica o investigador, o ensino doméstico permite a transmissão de valores religiosos, morais e de patriotismo, além do ensino de habilidades básicas. Resumindo: “A maioria destas famílias parece optar pelo ensino doméstico devido à excessiva natureza burocrática do sistema educativo convencional, da incoerência curricular e da sua desconexão com as vidas particulares, esperanças e culturas dessas comunidades”. 
 
Maior procura deve-se à “deterioração da escola tradicional”
 
O número de crianças e jovens inscritos nesta modalidade de ensino passou de 82, em 2009/10, para 338, em 2013/14. Esta mudança de paradigma deve-se ao aumento do trabalho em rede entre as famílias, à abertura de vários centros de apoio ao aluno de ensino doméstico e à “deterioração da escola tradicional”, ideia defendida pelos inquiridos do estudo de Álvaro Ribeiro. “Os pais, muitos deles com formação superior e forte espírito crítico, acreditam que é necessário deixar de perpetuar uma educação baseada no controlo, na repressão das emoções, na competição e no sacrifício da felicidade atual”, reitera.
 
O investigador, que acompanha alunos do ensino doméstico há mais de cinco anos, desconhece exemplos de insucesso: “As notas de Português e Matemática costumam ser superiores às médias nacionais”, defende. A falta de sociabilização, que é uma das maiores críticas apontadas a este método, não preocupa as 100 famílias envolvidas no estudo. “As crianças não passam 100% do tempo fechadas em casa. O dia-a-dia é de intensa atividade interativa, muito diversificada, com indivíduos de várias idades e contextos”, garante o investigador do Centro de Investigação em Educação da UMinho.


Sabia que…?
 
- As crianças do ensino doméstico aprendem um currículo e fazem os exames requeridos pelo Estado português;
- As famílias estão conscientes da sua missão, formam-se continuamente para ensinarem os seus filhos e trabalham em rede;
- O ensino doméstico é um projeto coletivo, intra e interfamiliar;
- Enquanto projeto familiar, é liderado sobretudo pelas mães que, apesar da sua formação académica (superior), estão em regime de formação contínua em todas as áreas que forem tidas como críticas para o desempenho dos menores;
- São famílias amigas, muito disponíveis para conversar sobre educação, mas com criatividade semântica e acutilância crítica.