Pode o cidadão escolher mobiliário urbano?

02-06-2017 | Pedro Costa

Com exemplos de materiais que usa no projeto de investigação (foto de Nelson Garrido/Público)

A superfície muda de cor ao ser tateada (foto de Diogo Cunha/EEUM)

O trabalho incluiu testes de perceção multimodal e interação com os materiais, usando a psicologia experimental e cognitiva

O "2U_UserUrbe" inclui 48 materiais têxteis para estamparia digital, desenvolvidos com alta tecnologia e para produtos de exterior, que são resistentes a intempéries, ao fogo e com proteção ultravioleta

Levou o seu estudo às tertúlias informais "PubhD UMinho", em maio de 2016, em Guimarães (foto de Chisoka Simões/STOL)

A apresentar os seus projetos no WCCA'2012 - V Congresso Mundial de Comunicação e Artes, em Guimarães

Participou no Festival Internacional de Jardins de Ponte de Lima, com o projeto "Paraíso - Um lugar utópio ou não", em 2013

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Gabriela Jobim, da Escola de Engenharia, criou um sistema sensorial que permite alterar a cor ou atribuir aromas, podendo ser aplicado em qualquer tipo de material ou superfície.




Uma investigadora da UMinho está a desenvolver uma ferramenta digital capaz de colocar as pessoas a decidir que tipo de mobiliário urbano preferem, com escolhas baseadas nas emoções, cores e odores. Gabriela Jobim, investigadora do Centro de Ciências e Tecnologia Têxtil (2C2T) da Escola de Engenharia (EEUM) e do Centro de Computação Gráfica (CCG), criou um sistema de cores sensoriais que pode ser aplicado em qualquer tipo de material ou superfície. No âmbito do seu trabalho desenvolveu uma paleta de cores sensoriais com base numa tecnologia que permite alterar a cor ou atribuir aromas aos materiais trabalhados.
 
Viver um futuro de lugares mais inteligentes e sustentáveis, por efeito disso mesmo, com melhor qualidade de vida, é o objetivo da ferramenta digital e tecnológica 2U_UserUrbe desenvolvida pela investigadora: "É uma metodologia de design têxtil sustentável para mobiliário urbano de descanso, desenvolvida através das experiências emocionais dos utilizadores de espaços públicos”, explica Gabriela Jobim. Para esta artista plástica, a abordagem é muito pertinente, pois “os espaços urbanos e cidades estão a mudar, já que caminhamos para um futuro onde o espaço público poderá ser uma extensão do habitat das pessoas”. 
 
Desenvolvido no âmbito do seu doutoramento, o projeto pretende ainda compreender de que forma os cidadãos interagem com o ambiente urbano das suas cidades ou locais por onde circulam, Por isso, sensações de prazer, de conforto e de agradabilidade para os utilizadores dos espaços públicos são objetivos “alcançáveis e desejáveis”, graças a uma recolha dos indicadores que a ferramenta vai proporcionar. O que pensam as pessoas dos materiais usados no mobiliário urbano atual é algo que também está no ponto de partida deste trabalho; por isso, a engenheira têxtil tem como um dos objetivos "substituir, ou reduzir, alguns dos materiais tradicionais usados atualmente neste tipo de mobiliário”, que são, normalmente desconfortáveis, frios e pouco flexíveis. “O espaço público pode ser a extensão da casa de cada um, logo tem que ter relevância pública”, defende.

 
As experiências sensoriais com a start-up em vista
 
Por enquanto, esta ferramenta ainda está a ser desenvolvida, devendo estar concluída em setembro de 2017 para se transformar numa start-up. No entanto, o trabalho de campo atingiu a fase crucial, pois Gabriela Jobim escolheu algumas das principais cidades do Norte do país para proceder a um conjunto de inquéritos. Ao falar e questionar cidadãos comuns sobre o design, a forma, a textura ou a cor vai conhecendo as preferências dos utilizadores. Neste contexto, está a avaliar como a cor afeta as emoções das pessoas, recorrendo ao sistema de cores multissensorial que criou para outros projetos, que já tem mais de 500 cores e materiais inteligentes. Com recurso a especialidades como a psicologia experimental e cognitiva, além das emoções, estuda ainda a perceção da qualidade dos produtos e o valor que as pessoas lhes atribuem.

O conceito de materiais inteligentes implica falarmos de substâncias ou materiais que “são capazes de responder de forma adequada às mudanças de fatores externos, alterando a sua estrutura e as suas funções” declara. A investigadora acrescenta que a melhor forma de explicar no que consiste a tecnologia que criou "é através de imagens e interação com as cores, pois elas só reagem por um estímulo”.  
 
No âmbito da cor, a especialista está a desenvolver, em parceria com o colega Diogo Cunha, da UMinho, um mobiliário urbano de descanso que muda de cor quando exposto ao sol ou na interação com o utilizador. O “happy” – como o batizaram – pode, por exemplo, mudar de verde para amarelo se for exposto a um aumento de temperatura. Além disso, está equipado com um sistema de energia solar que permite recarregar um dispositivo a bateria. Neste equipamento é utilizado um material inteligente capaz de sofrer alterações cromáticas - entenda-se que “são materiais programados para responder de uma forma controlada a um estímulo ambiental ou ação”, adianta.


"Happy", a peça de mobiliário interativa e sustentável

O “happy” é uma peça de mobiliário interativa, inteligente e sustentável, produzida com material têxtil de poliéster reciclado sustentável, feito 100% com garrafas plásticas PET. Para a investigadora “o conceito está relacionado com pesquisas em design emocional sobre a compreensão de como nos relacionamos com os produtos e objetos do quotidiano”; neste caso, com uma vantagem funcional acrescida - a capacidade de captar energia para conectar um dispositivo móvel.
 
Paralelamente à questão da tonalidade e da reação/emoção que provoca, Gabriela Jobim investiga também os aromas nestes materiais crómicos, através da introdução de microcápsulas. "Quando aplicado no objeto, o aroma só exala ao toque, quando as microcápsulas são ativadas pelo contacto com as mãos", explica a investigadora. Por exemplo, no tecido vermelho foi aplicada uma fragrância de morango e os aromas testados são fragrâncias de flores, de frutos ou chocolate. Conclui que “o cheiro tem uma forte influência nas sensações das pessoas e é um fator importante de motivação no comportamento”, pois afeta áreas do cérebro que trabalham com as emoções, memórias e motivação, que pode levar a uma resposta comportamental específica.
 
A tecnologia permite ir além desta aplicação prática. Algumas aplicações podem ser testadas na estética e no design de produto, na publicidade e na comunicação de marcas, nos jogos, no material didático interativo e nos objetos para o lar, como têxteis, papéis de parede, revestimentos, entre outros. Tratando-se de uma tecnologia sensorial, pode ser aplicada inclusive com pacientes de terapia ocupacional e psicologia. “Tenho tido alguns contactos nesta área e que faz parte das minhas pesquisas em design emocional, podendo entrar no design experimental e interação homem/objeto” explica a investigadora.