“Sempre gostei de trabalhar com livros antigos e de os conservar”

28-11-2017 | Paula Mesquita

É funcionário da UMinho há 31 anos, mas a sua ligação à instituição é bem mais antiga

Aos 17 anos veio para a UMinho trabalhar na preparação de textos e conteúdos de apoio aos estudantes

Um dos primeiros trabalhos em que colaborou no serviço foi o nº 1 da Revista FORUM (1987), do Conselho Cultural da UMinho

Após a Reprografia e Publicações fechar em 2010, veio para a Biblioteca Pública de Braga, também no Complexo Largo do Paço

Jogou futebol de salão na UMinho e participou nas primeiras edições do Troféu Reitor

Alfredo Barbosa (guarda-redes) entre os colegas da equipa de futebol de salão, em 2004

“Alguns dos depósitos da BPB estão organizados por mim e conheço-os muito bem”, afirma

“Não gosto muito de ler. Só quando estou a trabalhar na sala de leitura, como vou manuseando alguns documentos”, confessa

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Alfredo Barbosa

Nasceu em 1965, em Braga. Conheceu os corredores da Reitoria aos 8 anos, quando depois da escola vinha ter com a mãe e as suas colegas do serviço de bar, que funcionava no 1º andar. Trabalhou no Serviço de Reprografia e Publicações e hoje está na Biblioteca Pública de Braga. Já perdeu a conta aos livros, jornais, Diários da República e revistas que lhe passaram pelas mãos.



O primeiro contacto com a UMinho deu-se numa idade ainda muito tenra. Conte-nos com foi.
Aos 8 anos comecei a vir para a Universidade do Minho brincar, depois da escola. A minha mãe trabalhava no serviço de bar, no edifício da Reitoria, que, na altura, funcionava no 1º andar. As colegas da minha mãe, para brincarem comigo, pediam-me para tirar cafés e faziam-me pendurar na alavanca para fazer a pressão com o meu peso! [sorriso] Brinquei com toda a gente que trabalhava no Largo do Paço; os espaços da Reitoria estavam todos abertos e eu andava sempre de um lado para o outro. Passei ali quase todo o meu tempo livre.
 
Quando é que começou a trabalhar na UMinho?
Vim aos 17 anos trabalhar para o Edifício do Castelo, com o então reitor Sérgio Machado dos Santos, na preparação de textos e conteúdos de apoio ao estudo dos alunos. Era um serviço contratado a uma empresa, para a qual eu e mais dois colegas trabalhávamos. Fazíamos uma espécie de fotocópias através de matrizes. Depois dos documentos copiados, tinha que os alcear, isto é, numerar e agrupar as páginas. A mesa onde fazíamos essa ordenação levava 44 páginas. Passávamos praticamente o dia em redor da mesa a executar esse trabalho. Depois de agrupados e agrafados, trazíamos os documentos para o edifício da Reitoria, dividíamos em função dos destinatários e levávamos ao setor dos Correios para distribuição.
 
Tornou-se funcionário efetivo mais tarde.
Sim, em 1986. Comecei a trabalhar no serviço de Reprografia e Publicações, no Edifício do Castelo. O primeiro número da revista FORUM já contou com a minha intervenção! [sorriso longo] As minhas funções de impressor ligavam-se essencialmente com as artes gráficas, a encadernação, a fotografia, entre outras, embora tivesse aprendido a fazer um bocadinho de tudo, porque na ausência dos colegas fui sendo capaz de os substituir. Em 2008 começou a falar-se sobre a possibilidade de encerramento daquele serviço, o que sucedeu dois anos mais tarde.
 
Foi um período difícil?
Foi muito complicado emocionalmente. Os funcionários contavam já com muitos anos de trabalho naquelas funções, mas a verdade é que chegámos a um ponto em que se contavam as horas e os minutos, que demoravam a passar. Muitos de nós sentimo-nos inúteis, infelizmente.
 
O que levou à extinção daquele serviço?
No meu entender, houve várias razões que, progressivamente, ditaram o seu declínio. A distância entre os campi permitiu a instalação de serviços particulares de reprografia e publicações que, por terem a mesma designação, trouxeram algumas confusões e desagrados por parte de quem nos procurava, ou que procurava os serviços existentes nos campi. Por outro lado, muitas publicações da responsabilidade das Escolas e dos Institutos começaram também a ser produzidas em gráficas externas. Os espaços em redor do Edifício do Castelo passaram a ser apenas pedonais, trazendo alguns constrangimentos a quem aí se deslocava para imprimir ou produzir os seus documentos. Aos poucos, os serviços de Reprografia e Publicações foram perdendo a centralidade, até quase ao esvaziamento.
 
Como decorreu esse processo?
Apesar de ser frustrante, porque todos (creio que posso falar em nome coletivo) gostávamos do que fazíamos, todos nos orgulhávamos do trabalho que o serviço desenvolveu ao longo da sua existência, foi tranquilo! [sorriso] Felizmente, todos os funcionários tiveram a possibilidade de indicar outros postos de trabalho, na UMinho, para o prosseguimento das suas carreiras profissionais. Dos dez trabalhadores, alguns optaram já pela aposentação. Eu decidi vir para a Biblioteca Pública de Braga [BPB].
 
O que o fez escolher a BPB?
Ter experiência na reprografia e estar ligado aos livros e publicações periódicas impulsionou o meu desejo de continuar ligado a esta área e, para mim, foi uma mais-valia. É um trabalho diferente, mas muito interessante. Estamos em contato permanente com o público, que procura uma grande variedade de documentos. Para além disso, sempre gostei de trabalhar com livros antigos e de saber como os conservar, preservar e acondicionar. Também já conhecia o dr. Elísio Araújo, diretor da BPB. Jogámos futebol de salão juntos e participámos nas primeiras edições do Troféu do Reitor, no ringue da Quinta da Capela. [sorriso] Já poucos se lembram disso! Também joguei com outros responsáveis, como o Fernando Parente, Carlos Silva, Nuno Catarino, Pedro Dias, o sr. Cunha, que praticava halterofilismo e conseguia elevar uma pessoa só com um braço! [risos]
 
Havia bom ambiente.
O ambiente era ótimo e fazíamos desses momentos desportivos quase uma brincadeira. Tornava-nos mais unidos. Mesmo noutras situações, os funcionários e os docentes encontravam-se e conviviam mais.
 
Sente mudanças nas relações interpessoais, com a passagem do tempo?
Algumas. Lembro-me de há uns anos participar num encontro anual de funcionários das universidades. Deixaram de ser realizados. Claro que as universidades cresceram, mas sinto que, hoje, essa união e companheirismo existe em muito menor grau. As pessoas levam os seus trabalhos e as suas tarefas demasiado a sério e, no meu entender, isso nem sempre significa um acréscimo da responsabilidade. Ter alguma alegria no trabalho proporciona um bom ambiente e ajuda-nos a ultrapassar alguns maus momentos. O importante é termos noção de que trabalhamos todos para um bem comum, que neste caso é a Universidade do Minho. Se temos de o [trabalho] fazer, então façamo-lo com positivismo e deixemos que esse gosto passe para o colega ou para o leitor, seja com uma brincadeira ou com um cumprimento! Desejar bom fim de semana à segunda-feira, ao final do dia é ótimo! [sorriso]
 

"Ainda tenho muito para dar a esta casa"

Voltando a 2010: começou logo a trabalhar na conservação?
Comecei a trabalhar na sala de leitura da Biblioteca. Partilhava com os colegas a vigilância da sala, o atendimento aos leitores, a receção dos seus pedidos e requisições. Nas requisições é indicado o livro, jornal, Diário da República, revistas, publicações ou outro documento pretendido. Cabia-nos procurar e levantá-los nos depósitos.
 
Os utentes não têm acesso livre ao acervo?
Não. Essa é a única forma de podermos garantir, de alguma forma, a preservação dos documentos. A consulta acontece apenas na sala de leitura e na presença de, pelo menos, um funcionário. Se se rasga uma página, ou um bocadinho de uma página de um jornal, já não temos forma de o substituir. Há pessoas descuidadas. Temos que olhar pelos documentos e garantir que são bem tratados enquanto são manuseados.
 
O que faz mais na BPB?
Outra tarefa, igualmente de extrema importância, é a organização do depósito. Colocar os livros no local certo é fundamental. Um livro fora do sítio numa biblioteca é um livro perdido e a BPB tem bastantes depósitos, não é nada pequena. Depois, também somos cuidadores a outros níveis: temos que diminuir a humidade nos espaços de arquivo, com recurso aos desumidificadores e manusear os documentos nos diversos depósitos. É importante que o façamos e que o saibamos fazer. Estas são as tarefas a que mais me tenho dedicado nos últimos anos. Alguns dos depósitos da BPB estão organizados por mim e conheço-os muito bem! [sorriso] Também presto apoio na montagem de exposições da responsabilidade da BPB ou que contem com a sua colaboração, sob orientação da dra. Rosa Cunha. As exposições decorrem essencialmente no hall de entrada da BPB, mas já compusemos exposições na galeria do salão medieval e no átrio da Reitoria, nas Bibliotecas dos campi, no Theatro Circo, no Palácio do Raio e na sala de exposições do Bom Jesus.
 
O que é que gosta mais de fazer?
Tudo o que se relaciona com a BPB.  Felizmente, há muito trabalho para desenvolver e coisas novas para fazer. Fui aprendendo a fazer um bocadinho de tudo e, porque eu sou assim naturalmente, consigo repartir-me por todas as tarefas que me são pedidas e desempenhá-las o melhor que sei, ajudando onde for necessário.
 
Considera-se no topo da sua carreira?
Não. De todo. Ainda tenho muito para dar a esta casa. Ainda tenho coisas para aprender! [sorriso]
 
O que espera ainda da UMinho?
A UMinho cresceu tanto, evoluiu tanto... É difícil descrevê-lo, mas espero acima de tudo que se desenvolva ainda mais e que se mantenha no topo do ensino superior português. No que diz respeito à BPB, precisa de mais espaço e mais funcionários. A BPB tem tanto para oferecer! Está a ser cada vez mais procurada e frequentada, mesmo para estudar. Isso é ótimo! A Biblioteca tem que ser capaz de corresponder a essa procura.
 
O que é que espera que as pessoas sintam quando vão à BPB?
Que se sintam bem recebidas, bem acolhidas. Que se sintam à vontade, quer para conversar com os funcionários que estão a ajudar, quer para utilizar os espaços e os documentos. Gostava que se sentissem como em casa.
 
Gosta de ler?
Deveria, mas não gosto muito de ler. Tem que ser um livro que me desperte muito a atenção. [risos] Não significa que não leia. Enquanto estou a trabalhar na sala de leitura, como vou manuseando alguns documentos, vou lendo.
 


   O que mais sabemos sobre Alfredo

   Um livro. A primeira edição da FORUM.
   Um filme. “Pocahontas”, da Walt Disney, quando levei as minhas filhas pela primeira vez ao cinema. O entusiasmo
   delas foi inesquecível!
   Uma música. Gosto e ouço de tudo.
   Um prato. Gastronomia portuguesa. Adoro. Vivo para comer e como para me entreter! [risos]
   Um momento. Dois. O nascimento das minhas filhas.
   Uma viagem. Monção e Melgaço.
   Um clube. A seleção portuguesa.
   Um passatempo. Jogar futebol.
   Um vício. Jogar futebol!
   Uma figura. Eu próprio. Não sou uma figura pública, mas sou uma figura!
   Um sonho. Não tenho tempo para sonhar! [sorriso]
   A UMinho. Um futuro. Já não tanto para mim, mas para muitos, vindouros.