O twitter ajuda a prever o mercado bolsista

30-04-2018 | Nuno Passos

A receber o prémio, ao lado do presidente da EEG, Francisco Veiga, aquando do 36º aniversário da Escola

Foto: Jorge Barrote/EEG-UMinho

Foto: The Indian Express

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Nelson Areal venceu Prémio de Investigação 2018 da Escola de Economia e Gestão por um estudo que prevê e explica retornos, volatilidades, volumes de negócio e índices de opinião.




Uma equipa da Universidade do Minho mostrou que é possível usar informação do twitter para prever e explicar retornos, volatilidade, volume de negócios e índices de opinião no mercado acionista. O trabalho analisou mais de 31 milhões de tweets de 3000 empresas dos EUA entre 2012-2015, que continham a cashtag (hashtag com o dólar), uma convenção digital que se refere ao mercado de capitais. A ideia foi encontrar uma métrica para o “sentimento” positivo ou negativo do mercado, a partir dos dados dessa rede social. A pesquisa apresenta vários avanços face a estudos similares, ao focar-se num período longo de tempo, com grande quantidade de informação (big data), usando dados diários e técnicas estatísticas robustas, evitando generalizações circunstanciais.
 
O artigo saiu na revista “Expert Systems with Applications” e valeu a Nelson Areal o Prémio de Investigação da EEG pela melhor publicação de um cientista daquela Escola em 2017. A pesquisa, que decorreu ao longo de quatro anos, teve a coautoria de Paulo Cortez, professor da Escola de Engenharia da UMinho, e de Nuno Oliveira, que foi orientado por ambos na sua tese doutoral no Centro Algoritmi e é, agora, data scientist no Centro para a Excelência e Inovação da Índústria Automóvel (CEiiA). O estudo foi exemplar a cruzar as áreas das finanças e dos sistemas de informação.
 
A equipa da UMinho usou para o efeito o software estatístico R, de código aberto. No artigo, explica a forma de execução de diversas tarefas, como a recolha de tweets, as ações de pré-processamento, o uso de léxicos de opinião e a aplicação e avaliação de métodos de aprendizagem automática, usando um léxico criado anteriormente pelos autores. A equipa aplicou esse léxico específico para texto de microblogues, neste caso o twitter, relativos a mercados de capitais. “É ideal para apurar a métrica de sentimento em posts de 140 carateres ou pouco mais, que é uma linguagem muito diferente de outros documentos”, justifica Nelson Areal.
 
Mais: a ferramenta criada permite prever a evolução dos “índices do sentimento” apresentados semanal ou mensalmente pela própria Associação Americana de Investidores Individuais (AAII), pela Investors Intelligence (II) e pela empresa Sentix. “Como no trabalho tratámos grandes volumes de dados diários, é possível de forma fiável, barata, rápida e, sobretudo, automática extrairmos informação que consegue medir o sentimento de determinados agentes que poderá afetar o preço de uma ação, ou a evolução dos mercados, sem sequer lhes perguntarmos”, assinala.
 
No entanto, Nelson Areal deixa uma ressalva: “Não demonstramos que é possível criar uma carteira [de ações bolsistas] que permita obter uma rendibilidade superior àquilo que seria normal. Isto é, não dizemos que podemos obter ganhos com o uso desta informação no twitter. Apenas dizemos que pode ser útil para prever o comportamento futuro de algumas dessas variáveis”, realça.
 
A investigação vai ter continuidade, até porque importa detalhar na estimação do sentimento as relações entre as pessoas e os influenciadores, que não tinham sido explorados: “Nas redes sociais há pessoas que têm claramente um peso diferente, o que dizem tem mais influência”. Nelson Areal e Paulo Cortez coorientam agora Bruno Vieira, no âmbito do seu doutoramento MAPi em Ciências da Computação, para explorar o impacto da influência e reputação dos participantes nos social media.


Sobre o prémio
 
O Prémio de Investigação, entregue no aniversário da EEG, distingue o melhor artigo publicado a cada ano por docentes, investigadores e pós-doutorandos afetos à Escola ou aos seus centros de investigação CICP e NIPE. O júri inclui os presidentes dos conselhos científicos das faculdades de Economia das universidades de Coimbra, Porto e Nova de Lisboa, do Instituto de Ciências Socais da Universidade de Lisboa, do ISCTE e dos institutos superiores de Ciências Sociais e Políticas e de Economia e Gestão da Universidade Técnica de Lisboa.
 
Para Nelson Areal, a distinção foi “o reconhecimento da qualidade do trabalho” por parte da sua instituição. “Mas devo lembrar que tem três autores, pelo que somos todos distinguidos”, acrescenta. O artigo laureado intitula-se "The impact of microblogging data for stock market prediction: using twitter to predict returns, volatility, trading volume and survey sentiment indices". Outras partes do estudo saíram ainda no livro “Text Mining and Visualization - Case Studies Using Open-Source Tools”, da norte-americana CRC Press, nas atas da conferência internacional “Web Intelligence, Mining and Semantics (WIMS'16)”, realizada na França, e num artigo da revista “Decision Support Systems”, da editora holandesa Elsevier.
 
Nelson Areal nasceu há 47 anos em Benguela, Angola, viveu muitos anos no Brasil e fixou-se depois em Portugal. É licenciado em Gestão, mestre em Administração de Empresas, ambos pela UMinho, e doutorado em Contabilidade e Finanças pela Universidade de Lancaster (Reino Unido). Foi auditor da Ernst & Young e veio em 1994 para a UMinho, onde é professor associado, diretor do Departamento de Gestão da EEG e investigador do Núcleo de Investigação e Políticas Económicas e Empresariais (NIPE).



Os tiroteios em massa mexem no mercado do armamento?
 
Nelson Areal está a estudar o impacto dos tiroteios em massa nas ações bolsistas da indústria do armamento dos EUA. Estes assassinatos em massa são raros no resto do mundo, mas frequentes nos EUA, por vezes com vários casos numa semana e que têm gerado uma crescente indignação social. O que o professor da UMinho quer saber é até que ponto os investidores consideram que aqueles eventos imprevisíveis e extemporâneos podem forçar a administração norte-americana a criar regulação que influencie a venda de armas ligeiras. “Se isto não for antecipado pelos investidores, pode prejudicar o valor das suas ações. Mas se os investidores acharem que os tiroteios e o buzz gerado não mudarão a lei de forma substantiva (é o que tem sucedido), o impacto será nulo”, frisa o docente, que aqui deixa a análise das redes sociais para passar à informação financeira.
 
Não se trata aqui de armamento pesado ou militar, que à partida não será afetado por estes incidentes, mas de armas para uso civil. Tem havido movimentos regulares associados com o controlo de armas nos EUA, mas para já sem afetar em particular as empresas do setor. “Se perguntarmos a um norte-americano se considera provável haver um tiroteio em massa nos EUA em breve, a resposta comum face à realidade recente é que sim”, situa Nelson Areal. Ora, se admitirmos que isso já vai acontecer, resta saber se estes acontecimentos alteram a probabilidade de serem introduzidas restrições substanciais à venda de armas ligeiras, o que pode ser analisado pela resposta dos mercados acionistas a estes eventos.