"Aqui não sinto problemas de mobilidade"

16-10-2018 | Pedro Costa

1 / 3

Delfim Macedo, 52 anos e da Póvoa de Lanhoso, tem malformação esquelética e intolerância ao glúten. É formado em Informática, quase mestre em Ensino de Informática e quer lecionar na área. Inspirador.




Delfim Macedo tem uma história de vida percorrida por entre dificuldades várias. A que mais o prejudica é uma malformação esquelética, que, associada a uma intolerância ao glúten, torna os seus dias muito difíceis em termos de locomoção. Vindo de Covelas, Póvoa de Lanhoso, este licenciado em Engenharia Informática prepara-se para vencer mais uma etapa académica, estando a concluir o mestrado em Ensino de Informática. Lecionar é o seu novo propósito, depois do sonho da Informática ter esbarrado na difícil empregabilidade.


Como é que esta aventura académica começou?
Foi em 1990. Quando terminei o liceu eu queria Eletrónica, mas em Braga, das opções que tinha, o mais próximo era Engenharia de Sistemas e Informática. Os meus pais até queriam que eu fosse professor de Matemática, mas eu não estava muito interessado. Eu queria era a eletrónica.
 
Começou por aí...
Não, porque inicialmente entrei em Engenharia Civil, mas pouco depois fui assistir a umas aulas de Matemática e Ciências da Computação e acabei por transferir-me. Só que tive muitas dificuldades e desisti. Na altura ainda não sabia algo que descobri mais tarde - uma intolerância que tenho ao glúten, que me provoca, além de dores e cansaço extremos, alguns problemas de sonolência e de memória.
 
O que foi fazer?
Naquele intervalo de tempo foi difícil arranjar trabalho, ainda estive na Primavera Software em 2005 e num projeto de digitalização de parcelas de vinha em Fafe, isto em 2000. Mas um amigo da Maia, que também tinha desistido, ligou-me um dia e desafiou-me para regressarmos ao curso. Assim fizemos. Acabamos a licenciatura, mas entretanto estive três anos a tentar arranjar trabalho.
 
O que fazia?
Enviava currículos, ia pessoalmente às empresas, mas não conseguia. Um amigo desafiou-me a dar umas aulas de formação, para isso acabei por ir tirar o CCP [Certificado de Competências Pedagógicas] e é aquilo que faço hoje, sou formador de Informática. Entretanto, outro amigo que enveredou pelo ensino acabou o curso e disse-me que eu devia fazer um mestrado em Ensino, para poder lecionar e seguir esta via. Hoje vejo com bons olhos essa carreira e é esse o meu objetivo. No próximo ano pretendo candidatar-me ao ensino público.
 
Curioso...
Sim, aquilo que os meus pais queriam que eu fizesse e eu rejeitava é, no fundo, aquilo que acabo por fazer na vida.
 
Como foi começar a dar aulas e formação?
No início foi complicado. Nunca pensei fazê-lo e, no início, foi difícil por causa do controlo dos nervos. Mas adaptei-me. Agora o mestrado está a dar-me ferramentas fundamentais. Dá todas as condições para os professores se prepararem para uma forma de lecionar adequada ao século XXI, banindo completamente o modelo de aulas tradicionais, que está ultrapassado. Tem sido espetacular!
 
É uma nova vocação para si...
Sim, é um gosto sentir que os alunos saem das aulas com ensinamentos que lhes deixamos. A sensação é fantástica!
 
 

“O Gabinete para a Inclusão é fundamental para nós”
 
Na sua condição, com as suas dificuldades de locomoção, é mais difícil fazer um percurso no ensino superior?
Neste momento já não se sente isso na UMinho. Quando vim para cá em 1990 havia muitas dificuldades. Por exemplo, os elevadores não funcionavam e eu tinha que usar as escadas, cheias de gente, o que me deixava cansadíssimo. Um dia, a filha do reitor da altura estava atenta e criou um gabinete – o GAED –, que começou a tratar destas coisas e, no campus de Gualtar, começámos a ter as condições que tornaram tudo mais fácil...
 
Faltava sensibilidade?
Sim, na altura ainda se falava pouco destas questões da acessibilidade e mobilidade a nível nacional e os problemas existiam em todo o lado. Praticamente todos os entraves prejudicavam o meu desempenho, porque eu ficava fisicamente esgotado.
 
O que foi mais importante em todo este percurso?
O apoio do GPI [Gabinete para a Inclusão] é uma ajuda imensa. É fundamental para nos apoiar a ter bons resultados, porque ajuda-nos a eliminar ou minimizar as dificuldades extra que a nossa condição nos traz, sejam elas quais forem. A UMinho tem uma importância decisiva no meu percurso de vida, mas o GPI facilita muito, senão seria bastante difícil.
 
O que é que hoje faz falta na UMinho no âmbito da inclusão, na sua opinião?
Não tenho noção de muito do que a UMinho ainda possa melhorar. Nas salas de aula sei que os professores também se vão adaptando, numa situação ou noutra. No meu caso, não houve necessidade de adaptação especial. Mas tive colegas com problemas de visão - alguns eram mesmo invisuais - que tinham testes especiais adaptados, assim como colegas com dificuldades motoras nos membros superiores a quem era dado um pouco mais de tempo para acabar os testes.
 
O que falta então no mercado de trabalho para esta inclusão?
Não sei bem, até porque as empresas têm benefícios ao empregar pessoas com grau de deficiência...
 
Sente que no seu caso a sua condição prejudica a empregabilidade?
Não creio. Penso que no meu caso é mesmo a idade. Em condições iguais, os empregadores contratam candidatos mais novos. Na minha área até vai havendo oportunidades de trabalho, mas já cheguei a tentar vagas onde havia candidatos que estavam a fazer doutoramentos, logo é uma área muito competitiva.
 
As empresas estão preparadas com acessibilidades para mobilidade reduzida?
Acredito que muitas não estejam preparadas e talvez isso tenha o seu peso.