O rosto sorridente da nossa biblioteca de Direito

20-12-2019 | Nuno Passos | Fotos: Nuno Gonçalves

1 / 11

Carmelinda Vilaça

É a funcionária mais antiga da Escola de Direito, que viu nascer há 26 anos e tão bem conhece. A assistente técnica já fez apoio a direções e docentes, colaborou em publicações, na área administrativa  e, desde 2015, assume o expediente da nova biblioteca da Escola. A bracarense de 56 anos é licenciada em Educação pela UMinho e chamada "mãe de todos os alunos", por apoiá-los amiúde.


Quais são as suas origens e que recordações tem da infância e juventude?
Família humilde, mas rica em felicidade.O padrão normal de há muitos anos: o pai trabalhava e a mãe cuidava dos filhos. Sendo a menina lá de casa, pode imaginar como era tratada, ou seja, como uma princesa, mas mais parecida com a princesa Merida, ou não fosse criada no meio de oito rapazes! Foi uma infância linda. O mesmo não se pode dizer da juventude, que foi curta. Talvez por isso ainda hoje me sinta uma menina, com vontade de estar na frente e pronta para novos desafios. De qualquer forma, foi uma juventude feliz, nos anos 80, onde foi permitido à minha geração descobrir novos mundos que as gerações anteriores não tiveram, desde a música, à cultura pop e ao rock.

Como se deu a sua entrada nesta universidade?
A convite da Associação Académica (AAUM), em 1992, comecei a trabalhar na Reprografia - atualmente, Copissáurio -, e foi precisamente com essa mudança que, em 1995, passei a trabalhar na UMinho, quando a Secção de Direito se separou da Escola de Economia e Gestão e passou a Departamento Autónomo de Direito. Foi um grande desafio. São já 26 anos de experiência na Escola de Direito (EDUM), que de certa forma vi nascer e crescer… são muitas experiências, muitas pessoas boas, uma vida…

O que retém sobre os primeiros tempos na EDUM?
Tempos difíceis, sem saber trabalhar agilmente num computador ou até como tratar os professores. Na verdade, foram os melhores tempos que passei na UMinho. As pessoas que me diziam que seriam diferentes porque se tratava de gente do Direito foram as que me fizeram quem sou hoje. Pessoas que não viam cargos, mas vontade de trabalhar como se fossemos uma família. Por isso, chamo à EDUM a minha segunda casa. Tenho muitas recordações felizes. São muitos os colegas com quem trabalhei até hoje e que me ajudaram a crescer. Era uma luta enfrentar as dores de crescimento da Escola, mas também um desafio diário levantar um projeto que é hoje sólido e reconhecido por todos.

Ser a primeira funcionária da EDUM traz mais responsabilidade?
Não posso dizer que não tenho orgulho - embora o meu papel tenha sido limitado - em pertencer há tanto tempo a este projeto e que isso é reconhecido muitas vezes por colegas, professores e alunos. Posso dizer que me sinto um pouco como aquela princesinha da minha infância, só que agora num papel diferente, pois até “Mãe de todos os alunos" ou "Sol das nossas vidas" me chamam! [sorriso]

Que funções foi desempenhando ao longo dos anos?
Não passei por muitos serviços, mas a eles devo todos os primeiros ensinamentos. Quando a Secção de Direito passou a Departamento Autónomo, estávamos por nossa conta e eu tive de exercer todas as funções possíveis, desde secretária a auxiliar. Fiz um pouco de tudo: assistente de atividades diárias aos professores, trabalho administrativo, conselheira (em especial dos alunos), apoio às diversas direções, colaboração com as publicações ligadas à Escola... Até que, depois, nasceu a biblioteca da Escola e foi um processo natural de adesão, um local novo de muito contacto com a comunidade escolar, no qual me sinto completamente integrada. Além da coleção geral, esta biblioteca tem importantes acervos doados, como os de Salgado Zenha, Xencora Camotim e Gomez Segade.

Quais são as suas funções atuais?
Trabalhar na biblioteca de Direito é aliciante, há muito contacto com as pessoas e apoio às necessidades diárias da comunidade académica, que muitas vezes ultrapassa a estrita competência do trabalho com os livros.


A confidente de estudantes de vários cursos e geografias

Como consegue ser consensual entre os estudantes, nomeadamente os estrangeiros?
Não é difícil. Neste mundo competitivo e apressado, as pessoas dão valor aos pequenos gestos. Muitas vezes só o facto de terem com quem falar e confidenciar os problemas, terem alguém que lhes dispensa algum tempo para ajudar nos pequenos dramas, ter uma voz de apoio também... basta isso. No caso dos estrangeiros, isto é particularmente importante. Frequentemente, são pessoas que não estão integradas, encontram-se longe da família e dos amigos, dão valor a quem lhes possa dar algum apoio e orientação. Mas no caso dos alunos nacionais não é muito diferente. É com algum orgulho que a nossa biblioteca se encontra muitas vezes lotada com alunos, que não são só de Direito, porque encontram aqui um espaço onde se sentem integrados e a quem tentamos servir com a maior dedicação.

Que estórias curiosas guarda?
Uma das mais incríveis, pela negativa, foi ver-me de repente entre uma pessoa com uma faca e um professor que queria agredir. Por sorte não me aconteceu nada, mas olhando para trás ainda tenho pesadelos com a situação.

O que mais gosta no seu trabalho?
O contacto e convivência com os alunos e os professores. Este trabalho de relações públicas, que muitas vezes faço de forma informal, é muito gratificante.

O que é que os colegas aprendem com o seu trabalho?
Com a vida vamos aprendendo coisas boas e outras menos boas. Sempre preservei o bom ambiente e o bem-estar. Se estivermos bem, tudo à nossa volta funciona. Todos aprendemos uns com os outros. Os colegas, talvez por eu ser a menos jovem da equipa, sabem que contam sempre comigo seja para o que for e isso eu sei que retêm. Na hora de enfrentarmos problemas e desafios, sim, somos uma equipa.

Que pessoas mais a marcaram na UMinho?
Respondo citando Charles Chaplin: "Durante a nossa vida conhecemos pessoas que vêm e que ficam, outras que vêm e passam. Existem aquelas que vêm, ficam e depois de algum tempo se vão. Mas existem aquelas que vêm e se vão com uma enorme vontade de ficar...".

Já pensou em voltar aos estudos?
A toda a hora. Terminei a minha licenciatura em Educação há pouco tempo, que ficou em standby durante muitos anos dedicados a outros estudos. Agora, com este desafio de dinamizar a Biblioteca de Direito, quero explorar e fazer mil coisas.

O que ainda falta acontecer no seu percurso profissional?
Gostaria ainda de fazer muitas coisas dentro desta Escola. Continuar a investir no trabalho da sua Biblioteca para a tornar um local diferente, que ultrapasse o ser simplesmente uma sala de leitura, que seja um local de cultura e lazer também, onde as pessoas tenham o seu espaço de afirmação, para além dos estudos. De resto, não sei o que o futuro trará, mas sinto-me pronta para enfrentar novos desafios profissionais.



  Curiosidades

  Um livro. Adeus, Quinze Anos", de Claude Campagne.
  Um filme. "Me Before You", de Thea Sharrock.
  Um disco. "Sabão Rosa", dos OCENPSIEA.
  Um clube. Escola de Futebol Fintas (anda lá o meu neto).
  Um prato. Mariscada.
  Um sítio. Tavira.
  Um momento. Vários. O nascimento dos meus filhos, dos meus netos, principalmente da neta, que veio preencher
  um vazio desde a minha infância.  
  Uma qualidade. Saber ouvir.
  Um defeito. Colocar-me sempre na retaguarda.
  Um vício. Virar a casa do avesso.
  Um sonho. Ver os meus filhos e os meus netos plenamente realizados e felizes.
  Uma figura. S. Sebastião.
  Um lema. "O meu passado é tudo quanto não consegui ser. Nem as sensações de momentos idos me são saudosas: 
  o que se sente exige o momento; passado este, há um virar de página e a história continua, mas não o texto" 
  (Fernando Pessoa).
  A UMinho. A outra casa.