O mérito coletivo como caminho de futuro
A que nível de discussão se coloca a dicotomia inclusão social versus excelência?
A escola pública vive imersa na tensão entre os propósitos democráticos e as demandas de uma sociedade assente nos ideais do mérito e da seletividade. Vários grupos de pesquisa, sobretudo europeus e americanos, têm vindo a colocar no centro da agenda o estudo do dilema mais-melhor escola ou, por outras palavras, a relação de forças entre os mandatos democrático e meritocrático da escola pública. Na mesma linha, tenho vindo a aprofundar um modelo conceptual que propõe a ideia de um continuum balizado por cenários ideais-tipo, por oposição a uma classificação de natureza dicotómica de tipo mais-melhor. Tal significa que a realidade observada pode situar-se ora mais próxima dos extremos do continuum, configurando perfis de escolas mais democráticas ou mais elitistas, ora situar-se em diferentes lugares dentro desse mesmo espaço consoante as combinações possíveis. De acordo com esta proposta, o "cenário 1" dá conta de uma visão meritocrática de escola, apologista da seleção dos alunos e de uma política pedagógica centrada na construção da excelência académica; o "cenário 2" inscreve-se numa visão democrática de escola, que privilegia os princípios da igualdade de acesso e sucesso, da inclusão e da participação democrática. O espaço que medeia os dois polos representa as diferentes possibilidades de conciliação entre prioridades educativas observáveis nas organizações escolares.
A cultura resultadista tem caminho para evoluir para a inclusão?
Na minha visão (não dicotómica), é sempre possível encontrar alternativas que melhor se ajustem e aprofundem a ideia de uma educação mais humanista e democrática. Entre os inúmeros caminhos a trilhar, destacaria a necessidade de dessacralizar a conceção unidimensional do mérito, associado às esferas cognitivas e reprodutivas do saber, contrapondo com a ideia de pluralidade de formas de excelência, ampliadas às dimensões sociais, artísticas e culturais. O desafio poderá passar por novas formas de olhar a competição escolar, mais focadas em grupos, comunidades ou mesmo escolas e menos no culto da performance individual. O aprofundamento das valências inclusivas e democráticas não pode dispensar o reconhecimento e incorporação da diversidade de méritos e talentos individuais - eles próprios constitutivos da sociedade -, não tanto como um fim em si mesmo, mas como um processo catalisador do desenvolvimento integral do sujeito, condição essencial à realização da missão educativa da escola pública, enquanto projeto mais amplo de justiça e coesão social. Uma “escola excelente” não pode resultar de um único princípio de excelência.
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