Fungicidas estão a desequilibrar os ecossistemas aquáticos

30-06-2017 | Pedro Costa

Bruno Castro no Centro de Biologia Molecular e Ambiental, no campus de Gualtar, em Braga

O jovem investigador junto a uma albufeira do Gerês

Progressão da infeção de uma levedura microparasita (Metschnikowia bicuspidata) no seu hospedeiro (microcrustáceo do género Daphnia). O tebuconazol, ingrediente fungicida usado na agricultura, interfere na relação, sendo tóxico para o parasita

Frascos contendo folhas de amieiro colonizadas com uma comunidade natural de fungos aquáticos, incuindo concentrações diversas de agentes fungicidas, os quais, ao serem transportados para as linhas de água, afetam as taxas de decomposição

1 / 4

Bruno Castro, do Centro de Biologia Molecular e Ambiental (CBMA), está a mostrar que o uso dos químicos por ação humana tem impactado negativamente os lagos e as albufeiras.




Os lagos e albufeiras são campo de trabalho para Bruno Castro, investigador do CBMA da Escola de Ciências da UMinho. No seu trabalho de investigação tem demonstrado que o uso dos químicos por ação humana está a impactar negativamente as linhas de água, as albufeiras e os seus ecossistemas. Sustentando o seu trabalho de investigação na fronteira entre a ecologia e a toxicologia - muito virada para os fatores ambientais em ambiente de água doce -, o investigador combina abordagens de laboratório e de campo, no sentido de avaliar como as comunidades estão a reagir às mudanças ambientais induzidas pelo homem.
 
Tendo como referência pequenos crustáceos existentes nas albufeiras que desempenham um papel central nas teias tróficas e na transparência da água, o investigador refere que “estamos interessados nos inimigos naturais destes pequenos organismos, em particular num fungo que invade a massa corporal destes crustáceos, causando-lhes dano e reduzindo a sua esperança de vida”. Incidindo o trabalho de estudo nesta relação hospedeiro-parasita, a equipa de investigação avalia o efeito dos agentes químicos como os fungicidas, que atingem os sistemas aquáticos e alteram esta relação. “O que estamos a verificar é que alguns fungicidas são extremamente prejudiciais para o parasita, suprimindo a transmissão da doença”, revela o biólogo. O trabalho realizado em laboratório, com a simulação de relações em modelos experimentais, permite “estabelecer uma relação causa-efeito”, realça o cientista (VÍDEO).
 
Embora exista uma perceção negativa associada aos parasitas, Bruno Castro defende que “do ponto de vista ecológico, não é positivo que as atividades humanas interfiram na transmissão de doenças nas populações naturais”. O investigador do Centro de Biologia Molecular e Ambiental alerta para o facto de “os microrganismos, e em particular os fungos, desempenharem papéis-chave nos ecossistemas, como decompositores ou vivendo associados a outros organismos”.

Por todos estes fatores, este investigador junta-se àqueles que defendem que “deve haver diminuição da utilização dos agentes químicos, proporcionando uma utilização mais sustentável dos pesticidas”, que vai sendo regulamentada na forma de lei. A verdade é que, comprovadamente, a utilização extensiva de pesticidas nas produções agrícolas, nomeadamente na vinha, acarreta o transporte destes químicos pelas escorrências da água da chuva para os sistemas aquáticos. Os organismos que aí vivem, como crustáceos, larvas de insetos, anfíbios, ou peixes são particularmente sensíveis aos efeitos biológicos destes agentes químicos.



Contributos para a regulação

Esta investigação adquire especial importância face ao Quadro de Ação Comunitário e ao Plano de Ação Nacional para o uso sustentável dos pesticidas, que pretendem sensibilizar a população para os potenciais riscos destas substâncias e reduzir a aplicação de pesticidas no espaço europeu. O trabalho científico que se está a desenvolver permitirá a este grupo do CBMA concluir quais os agentes que são mais seletivos e os que são mais prejudiciais para os organismos aquáticos, produzindo conhecimento no sentido de apoiar decisões sustentadas para a regulamentação da utilização e respetivas listagens de agentes químicos usados na agricultura.

Entre as substâncias estudadas, destaca-se o tebuconazol, que é um composto fungicida, que tem um modo de ação semelhante a alguns fármacos antifúngicos utilizados em humanos, e que revela “um efeito muito radical na supressão da infeção do microparasita fúngico com que estamos a trabalhar, mesmo em exposições muito curtas”, divulga o investigador.
 
Depois de algumas conclusões avançadas de forma intermédia, através da produção de artigos científicos, o grupo de investigação está a preparar “um relatório para as autoridades competentes, embora se saiba que a própria União Europeia produz uma lista de fungicidas autorizados, bem como uma equipa que faz pesquisa e conforme as evidências científicas vai atualizando a lista e retirando aqueles compostos que representam maior risco ecológico”, revela Bruno Castro. Neste momento, o trabalho de investigação está a ampliar os modelos biológicos em estudo, “indo além do modelo hospedeiro-parasita, e procedendo a estudos análogos no processo de decomposição, onde os fungos aquáticos têm um papel muito importante”, avança.