Segundo a mitologia da Grécia antiga, Prometeu roubou o fogo aos deuses do Olimpo e deu-o aos homens, o que garantiu a supermacia destes face aos animais. Como castigo, Zeus ordenou que Prometeu ficasse agrilhoado no topo do monte Cáucaso, onde todos os dias uma águia lhe comia parte do fígado e este regenerava-se. O castigo deveria durar 30 mil anos. Seria Hércules a pôr fim ao tormento, matando a águia, e o centauro Quíron deixou-se prender, pois a substituição de Prometeu era uma exigência para assegurar a sua libertação.
A escultura do campus leva à letra essa filosofia de resistência e luta pelos ideais. O autor José Rodrigues conta que foi convidado para o trabalho por Artur Nobre de Gusmão, da Fundação Calouste Gulbenkian, e que a peça foi doada pelo Município de Braga à UMinho. Foi “inspirada pela ideia da Universidade, como centro de investigação e cultura, e pensada desde início em bronze, para melhor resistir às condições climatéricas e valorizar o espaço exterior”. A sua inauguração em 1992 reuniu figuras do meio académico e da sociedade civil. “Esta é das minhas obras preferidas, fi-la com grande prazer. Estou satisfeito e orgulhoso. As reações ao longo dos anos foram sempre positivas e vejo que a escultura se tornou uma referência do Minho”, confidencia o autor.
Ao contrário dos perfis sonhador de Brancusi, cubista de Zadkine ou lutador de Lipchitz, o titã imortal de José Rodrigues adota um registo expressionista, levando o observador a conetar os fragmentos. Imaginamos a rocha escarpada à qual foi preso por Hefesto, o corpo fixo sujeito à intensidade dos quatro elementos (sol, ar, vento, água) e à agressão diária da ave de rapina, a base inclinada da escultura a indiciar a paisagem agreste do isolamento. No novo livro “Bracara Augusta Fidelis et Antica”, os historiadores Miguel Bandeira, Rui Morais e Eliana Pinho destacam neste monumento “o flamejar perene do fogo sagrado e a expressão agónica do esgar libertador, que evoca a eterna e universal compaixão dos deuses (de Deus), na piedosa misericórdia pela precaridade da nossa condição humana”.
Prometeu tem sido alvo de esculturas em todo o mundo. A mais famosa fica em Nova Iorque, junto à pista de patinagem no gelo do Rockefeller Center. Vistosa e dourada, a peça de Paul Manship é um símbolo da elite e local de visita obrigatória. Prometeu inspirou também pintores (Miguel Ângelo, Gustave Moreau, Carlos Carreiro), compositores (Beethoven, Liszt, Orff, Scriabin, Fauré), filósofos e escritores (Ésquilo, Hesíodo, Platão, Aristófanes, Goethe, Gide, Müller), entre outros.
O país dar-lhe-á mais valor
José Rodrigues nasceu há 77 anos em Luanda e fez o curso de Escultura na Escola Superior de Belas-Artes do Porto em 1963, com a classificação máxima. Cofundou o grupo Os Quatro Vintes, a cooperativa de ensino artístico Árvore, a Bienal Internacional de Cerveira, a Escola de Artes e Ofícios de Cerveira, a Escola Superior Gallecia e lançou a Fundação com o seu nome, na antiga Fábrica Social do Porto, com vista à divulgação cultural. As poderosas esculturas mitológicas e de arte pública são a face mais visível do seu trabalho, como o Cubo da ribeira do Porto, o Monumento ao Empresário na Boavista, o conjunto A Pérola em Macau, O Torneio de cavaleiros nos Arcos de Valdevez ou o Monumento ao 25 de Abril em Viana do Castelo.
O autor arriscou diversas artes. Por exemplo, ilustrou livros de Eugénio de Andrade e Jorge de Sena, fez cenografias para a Companhia Nacional de Teatro da Galiza e grupos experimentais nacionais, produz cerâmica e medalhística. Já expôs nas bienais de Veneza e São Paulo e tem obras em museus e entidades de países como Japão, EUA, China e Hungria. Recebeu várias distinções, como as de Grande Oficial da Ordem do Infante D. Henrique, Soctip Artista do Ano e Prémio Tendências de Arte Contemporânea em Portugal. O Convento de San Payo, em Cerveira, guarda algumas obras suas e que colecionou por onde passou.