As tecnologias aproximam-nos na época natalícia?

21-12-2018 | Foto/Picture: Diogo Cunha

João Álvaro Carvalho

Pensando melhor, não sei se será bom ter cognitive robots ou outras novas tecnologias – se me tratarem de alguns assuntos, o tempo que me sobrar vai ser rapidamente absorvido. O ritmo da vida vai aumentar ainda mais.


O Natal é na próxima semana. Mas ainda não preparei a minha mensagem de Natal. Ainda procuro uma imagem que possa servir de fundo. Ando atento às decorações de Natal para tirar uma fotografia (uma selfie não; afinal o protagonista do Natal não sou eu) que me pareça valer a pena. Depois costumo escrever algo em cima, pelo meu próprio punho. Gosto de combinar o hi-tech com o low-tech (só possível por causa do high-tech). E dá para tratar disto tão tarde porque a tecnologia nos permite esperar pela última hora. Mesmo que só envie no dia 23 (ou até a 24), ainda vai a tempo. E posso escolher: e-mail, SMS, WhatsApp, Facebook... (Facebook acho que não; não gosto que “alguém” escolha por mim quem vai receber a minha mensagem).
 
Provavelmente vai ser mesmo no dia 23. Estou no estrangeiro, numa conferência, e as mensagens estão a acumular-se na minha caixa de correio. Quando chegar vou ter que recuperar. Do jet-lag – e também do jet-leg; é o que dá ter pernas compridas ;-) – e do work-lag. Além dos afazeres habituais, a conferência é fonte de novos assuntos. Agora, para além do que já tinha para fazer, estou a identificar novas coisas que gostaria de fazer. E também as que deveria estar a fazer! E as que já deveria ter feito... Também já acrescentei vários contactos na minha conta do Linkedin. Gente interessante com quem vou tentar manter contacto (escrevi “tentar”! “Do… or do not. There is no try!” diz o Yoda; é verdade; é o que digo aos meus estudantes quando me dizem que vão tentar). Gente com quem quero manter o contacto.
 
Mas onde vou arranjar tempo para tudo?
 
Estou ciente de que, nos últimos dias, perdi o fio à meada por várias vezes. A atenção fugiu-me para o tablet onde estava a fazer as minhas anotações. E onde de vez em quando ia googlar alguma coisa nova que me despertava a atenção. E, depois, mesmo ao lado tinha as mensagens de e-mail. E do WhatsApp. E outras distrações. Mas não era só eu. À minha volta, havia sempre imensa gente concentrada nos smartphones, tablets e laptops. Provavelmente o orador não estava a ser muito interessante (e aquela ideia de se ligar por teleconferência ao coautor a quem a recusa do visto – por ter uma nacionalidade suspeita; já perceberam em que país estou, certo?) – impediu de vir apresentar e defender o artigo também não ajuda; a desculpa era que o colega era a pessoa certa para responder às interessantes questões da audiência; é tão fácil estabelecer a ligação com o outro lado do mundo que ninguém resiste.
 
E eu também estou distraído ;-). Às voltas com umas ideias para um texto sobre Natal e tecnologias (da informação, claro). Pelo menos tenho os “dados” desligados. Sempre são menos umas tantas mensagens (daquelas apps a que não resistimos estar ligados) a distrair-me. E se tivesse o roaming de “dados” ligado, ia chegar ao fim do mês com uma conta calada. Ainda por cima na altura do Natal. Mas no outro dia os a ligação aos “dados” fez-me falta. Precisava de me orientar. À procura de umas lojas onde poderia procurar umas prendas de Natal diferentes. E sem os “dados”, não tinha acesso aos mapas. O GPS está sempre lá. Mas sem os mapas não ajuda muito. Dava-me jeito era um destes cognitive robots de que o orador está a falar. Podia tratar-me de alguns assuntos. Até das mensagens de Natal. Bem, essas é melhor não.
 
Mas não faltam tarefas que poderíamos delegar nos novos robots. Sempre ficaríamos com mais tempo para tratar de outras coisas. De coisas importantes. Por exemplo, para refletir o que está a acontecer às nossas vidas; o ritmo alucinante a que estamos sujeitos; as interrupções e distrações; a quantidade de informação a que podemos ter acesso, a que não resistimos ter acesso e que depois não conseguimos “digerir”; e o papel da tecnologia nisto tudo; e o que o futuro, com ainda mais tecnologia, nos reserva. Pensando melhor, não sei se será bem ter os tais cognitive robots ou outras novas tecnologias. Se a tecnologia me tratar de alguns assuntos, o tempo que me sobrar vai ser rapidamente absorvido. O ritmo da vida vai aumentar ainda mais.
 
Bem, pelo menos o Natal está à porta. Algum tempo mais relaxado. De Paz. Tempo também de rever a família. De celebrar. De trocar lembranças (é melhor não falar nas prendas; senão, lá acabo de volta à tecnologia; aos novos smartphones, ainda mais “smartes” do que os que tínhamos e que ainda aguentariam mais tempo, mas a nova versão é irresistível; e os jogos, ainda mais violentos e viciantes do que os anteriores; os gadgets que vão monitorizar a nossa saúde e que nos vão dizer que está na hora de fazer exercício; e que partilham com os nossos “amigos” os nossos feitos: os passos que demos; os quilos que perdemos (era bom :-) !); os badges que ganhamos).
 
Chega! É Natal. Desejo-nos um Smartanto Natal!

 
Professor do Departamento de Sistemas da Informação da Escola de Engenharia da UMinho