Sandra Cerqueira. A formação como alicerce numa vida em "mobilidade"

29-03-2019 | Daniel Vieira da Silva

Sandra Cerqueira confessa que "é sempre um prazer" voltar à UMinho

Atualmente desempenha funções de administradora nos TUB

A alumna participou recentemente nas CEO Talks promovidas pela Escola de Economia e Gestão

Sandra Cerqueira continua a colaborar com a EEG

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Nasceu no Canadá e vive em Braga. Licenciou-se em Relações Internacionais e aposta na formação contínua. Passou por empresas privadas e públicas e é administradora dos Transportes Urbanos de Braga




Porquê a escolha da Universidade do Minho para a sua formação superior?
Era na altura em que me candidatei, e continua a ser, uma academia de referência nacional ao nível da licenciatura em Relações Internacionais.

Lembra-se do primeiro dia na academia? Consegue identificar algumas das sensações vividas?
Do primeiro dia em específico não me recordo. Mas lembro-me que comecei esta fase com uma enorme expectativa e entusiasmo. Estava plenamente consciente de que estava a iniciar uma etapa determinante para o meu futuro e de enorme responsabilidade. A minha progressão pessoal, académica e o desenvolvimento intelectual começavam ali.

Que principais recordações guarda desses tempos?
Guardo muitas e boas recordações. Mas o que mais me marcou de forma muito positiva foram os professores e a maioria das disciplinas. Foram três intensos anos de aprendizagem sobre matérias que, na generalidade, me interessavam realmente. Foi neste período que aprendi sobre o compromisso de trabalhar em equipa.

Teve alguma passagem associativa/cultural nesse período?
No meu 2º ano, com um grupo de amigos, candidatámo-nos ao Núcleo de Estudantes Sociais Democratas da UMinho. Foi, na verdade, o mais próximo que posso associar a uma iniciativa associativa.

O que motivou a sua escolha do curso?
Na altura tinha três áreas de interesse. Tinha fascínio pela carreira diplomática e, simultaneamente, interesses em áreas como a Economia, Gestão e Política. Achei que a licenciatura em Relações Internacionais, na vertente económico-política, abarcava essas minhas áreas de interesse.

O que imaginava para o seu futuro naquela altura?
Imaginava-me, sinceramente, a trabalhar numa embaixada de Portugal em qualquer parte do mundo. Trabalhar e estudar fora de Portugal sempre fez parte dos meus objetivos, ainda antes de ingressar na universidade. Queria muito conhecer o mundo profissional e académico fora das nossas fronteiras. Ter a oportunidade de trabalhar e estudar fora de Portugal, conhecer novas culturas, conhecer outras gentes, outros territórios, outros costumes, outras religiões. Mas, em simultâneo, porque também me fascinava a área de negócios, fazia parte dos meus planos realizar um MBA, uma formação ainda desconhecida em Portugal.

Quando terminou a licenciatura rumou ao mercado de trabalho. Trabalhou na AICEPAEPLameirinho e em cargos de gestão em empresas multimunicipais, como a Braval. Que vivências recolhe dessas experiências?
Foram anos intensos e de enorme aprendizagem. Quando regressei a Portugal, em 2000, pois terminei a licenciatura nos EUA através do programa de intercâmbio existente entre a UMinho e algumas academias americanas, já tinha emprego assegurado no Gabinete do Investidor no ICEP, atualmente AICEP. Foi na altura em que chegavam os primeiros Planos Operacionais da Economia. Foi a minha primeira experiência profissional a sério. Depois de terminar o MBA na Escola de Gestão do Porto, hoje Porto Business School, fiz o meu percurso por duas empresas da área do têxtil, com vocação para os mercados externos, em particular o mercado dos EUA. Fui também convidada pela Associação Empresarial de Portugal para integrar o Gabinete de Internacionalização e Promoção Externa, para ser responsável pela implementação, operacionalização e gestão de um showroom permanente para empresas nacionais da fileira casa-decoração, em Nova Iorque.

Era um projeto seu?
Esse projeto profissional nasceu e cresceu comigo e, ainda hoje, é dos que recordo com mais orgulho. Aprendi muito nesse período. Depois, estive durante sete anos numa empresa portuguesa tecnológica na área da saúde – ALERT Life Sciences Computing, como assessora de projetos na área de pré-venda, prestando apoio direto às várias equipas comerciais que dispúnhamos pelo mundo, desde a América do Norte e Sul, Europa e países do Médio Oriente, bem como assessoria direta à administração da empresa, trabalhando diretamente com o diretor-geral. Nesta empresa ganhei um interesse muito especial pela área hospitalar. Em 2015 fui convidada para integrar o conselho de administração da BRAVAL e, agora, na empresa municipal Transportes Urbanos de Braga (TUB). Estas duas últimas empresas possibilitaram-me um contato com a realidade pública, com a gestão pública de empresas do setor empresarial local. Tem sido muito gratificante e sinto-me privilegiada por estar a ter a oportunidade de participar no desenvolvimento da nossa cidade e ao serviço da comunidade.

Regista-se no seu percurso uma necessidade de formação contínua. Considera ser essencial nos dias de hoje esta aposta na formação constante ao longo da vida?
Sem dúvida. As palavras da minha mãe sobre isso são que eu nunca paro. A verdade é que nós temos que evoluir sempre. No meu percurso, nas áreas em que trabalhei, procurei sempre aprender mais e evoluir nessa área. Por isso, fiz, por exemplo, uma pós-graduação em Gestão de Unidades de Saúde, nesta extraordinária academia, na época em que trabalhei numa software house de soluções clínicas para a área hospitalar. Estamos numa era em que tudo evolui a um ritmo alucinante, é um mundo muito competitivo. Uma formação constante fornece-nos ferramentas para nos diferenciarmos dos nossos pares.

Alia à vertente profissional uma componente de participação cívica e política. Considera ser essencial este envolvimento para uma melhor perceção da realidade e do território onde se insere?
Nunca escondi a minha ideologia partidária, da qual me orgulho. A minha participação cívica e partidária iniciou-se quando tinha 18 anos. Desde então, tenho participado de forma direta e, durante algum tempo, de forma indireta, mas sem nunca ter perdido contato com esta parte da minha vida. Acho que, acima de tudo, enquanto cidadã, devo ter uma palavra a dizer sobre o espaço que me rodeia, sobre as políticas públicas implementadas, ter uma voz ativa na sociedade. Defendo que todos temos essa obrigação. Não podemos nem devemos deixar apenas os outros decidirem o que é melhor para nós. Hoje em dia, por força das responsabilidades profissionais e políticas que assumo, é esta proximidade com a comunidade, os cidadãos e as várias dinâmicas da sociedade que me permitem conhecer melhor a realidade e o território e, principalmente, me possibilita conhecer de perto os problemas e dificuldades que as pessoas enfrentam, procurando, na medida da minha capacidade de intervenção, encontrar e contribuir para as soluções.


"O que mais valorizo no funcionário é o seu entusiasmo e a sua determinação"

Neste momento, assume funções de gestão na empresa Transportes Urbanos de Braga. Olhando para o paradigma da mobilidade, como se posicionam os TUB?
Os TUB têm assumido um papel relevante na promoção de um novo paradigma de mobilidade no concelho, mais sustentável, quer pela implementação e gestão de interfaces estratégicos que servem uma dinâmica cultural, económica e ambiental da cidade, quer pela melhoria de linhas existentes e criando novas linhas que servem as necessidades de uma população dinâmica e em crescendo, quer ainda pela introdução na sua operação de autocarros a propulsão elétrica, amigos do ambiente e, futuramente, autocarros a gás natural, com uma melhor performance ambiental. Atualmente, as cidades caracterizam-se por serem focos de uma maior complexidade e exigência, havendo indicadores mundiais que nos dizem que 54% da população mundial vive em áreas urbanas e que em 2050 se espera um aumento para 66%. Um dos fatores críticos desta concertação será a forma como as pessoas se movimentam e os meios que usam nas suas deslocações.

Os TUB têm uma responsabilidade acrescida?
Sem dúvida, porque têm que dar resposta a esta realidade e tornar-se o meio preferencial para o cidadão que nos escolhe para as suas deslocações diárias, oferecendo um serviço fiável e de qualidade. Trabalhamos diariamente nesse sentido e, agora, com um ainda maior entusiasmo, não só pelos investimentos em curso na renovação da frota e das infraestruturas do nosso parque, mas também por termos a possibilidade de abarcar novas dinâmicas e valências no panorama atual de uma mobilidade integrada, como a gestão do estacionamento público à superfície.

Que papel podem desempenhar os TUB numa lógica de coesão territorial? A UMinho pode ser aqui um aliado?
Atualmente, os TUB, que transportam cerca de 50 mil passageiros por dia, num concelho com 181.494, habitantes, segundo o último Censos, são um agente ativamente responsável pela coesão territorial, uma vez que operam nas 37 freguesias do concelho. Os nossos autocarros vão até aos limites da fronteira do concelho, cuidando assim de garantir a universalidade de acesso, a cobertura territorial e a continuidade do serviço público de transporte de passageiros como fator de promoção da coesão económica e social. Todos os agentes ativos são nossos aliados e vice-versa. Podemos trabalhar em conjunto na promoção de uma cidade mais acessível e inclusiva. E há evidencias desta aliança.

No que aos recursos humanos diz respeito, que competências valoriza num bom funcionário dos TUB?
Sempre defendi que o grande ativo de uma empresa são as pessoas, mas também a área mais desafiante e complexa é gerir pessoas. Posso afirmar que o que mais valorizo num funcionário é o seu entusiasmo, a sua determinação e dedicação às tarefas que lhe são atribuídas. Um funcionário proativo que trabalhe de forma colaborativa e que assuma o poder e a autonomia de decisão que lhe são delegados para maximizar o valor da empresa. Pessoalmente, tenho um enorme prazer e orgulho em potenciar o talento individual dos meus colaboradores, participar no seu crescimento individual e também coletivo. A empresa só tem a ganhar com esse crescimento.

No plano pessoal, quais são as suas maiores ambições?
Ser feliz junto com a minha família. Educar a minha filha com valores pessoais e sociais fundamentais, que a orientem e auxiliem a tomar as melhores opções ao longo da vida. Relacionar-me com pessoas que tenham backgrounds diferentes do meu. Conhecer outros territórios e gentes com hábitos, culturas e religiões distintas.

Percebemos que tem na família um alicerce da sua carreira profissional...
Procuro ter equilíbrio entre a dimensão familiar e profissional. Se descuramos a vida pessoal, certamente não vamos conseguir dar o nosso melhor no campo profissional.


As soft skills "são essenciais" e fazem a diferença

Num mês em que se dá um maior destaque ao importante papel da mulher na sociedade, sente que viveu ao longo da sua carreira qualquer tipo de discriminação?
É verdade que em muitas situações tive que trabalhar num meio dominado por homens, a esfera empresarial é fortemente liderada pelo sexo masculino. Nas empresas que representei em Nova Iorque, os seus representantes eram essencialmente homens. Nas funções que exerço também vejo isso. No entanto, sinto-me uma privilegiada, porque ao longo destes 15 anos não me senti nem sinto descriminada. Sempre me foram dadas oportunidades, que agarrei, independentemente da questão do género. Porém, no início da carreira profissional tive na verdade um episódio em que me senti discriminada, ou melhor, senti esta diferenciação entre homens e mulheres.

O que aconteceu?
Estava na fase final de seleção para uma empresa de consultoria nacional e a disputar um lugar com um candidato do género masculino. Na entrevista final, um dos responsáveis disse-me que eu tinha melhor curriculum e o percurso profissional que preenchia o perfil, mas que a opção era selecionar o outro candidato, porque naturalmente não teriam que lidar com a minha ausência por motivos de maternidade. Para ele, isso poderia comprometer os planos da empresa para aquela função.

Onde se vê daqui a dez anos?
É muito difícil responder a essa questão. Por muitos planos que possamos articular, a vida, as circunstâncias e o contexto podem encaminhar-nos para outro plano. O que nem sempre é mau. Olhe o meu exemplo! Mas de uma coisa tenho a certeza: certamente estarei a fazer algo com paixão e com o qual estarei comprometida a 100%. Quero estar continuamente a evoluir, a desenvolver as competências, a colocá-las ao serviço de uma empresa, gerando valor, a partilhar a experiência com outros, procurando contribuir igualmente para a sua evolução profissional.

Que conselhos consegue deixar aos estudantes da UMinho?
Recomendo a todos os alunos para, além das competências técnicas que lhes permitem evoluir profissionalmente, desenvolverem as competências transversais, que habitualmente designamos de soft skills. Estas são essenciais para um bom desempenho, independentemente da formação de base. Não duvidem que a universidade vos prepara bem para as competências técnicas. Prepara. E nas organizações nós colocamo-las em prática, aprofundamos estas competências e geramos outras. Mas julgo que há ainda trabalho a fazer na formação de competências socio-emocionais e comportamentais.

Dê exemplos.
A liderança, a iniciativa, a proatividade, a assertividade, o trabalho em equipa – que considero o pilar –, a gestão de equipas, a gestão do tempo, a tolerância ao stress, o estimular a criatividade e a inovação… Algumas pessoas podem alegar que muitas destas competências são inatas, nascem connosco. Não é inteiramente verdade. Nunca como hoje tivemos tanto talento, tantos quadros altamente qualificados. A diferenciação pode estar em ter pessoas nas nossas organizações que desenvolveram estas competências transversais.

Acha que a academia a moldou para as questões profissionais?
Acho que, na altura, a academia me deu as ferramentas essenciais para ingressar o mercado e iniciar a carreira. Mas, para evoluirmos, temos que estar continuamente a aprender e a moldar-nos e isso é um processo que se faz no decorrer do nosso percurso profissional.

O que mudou na Sandra Cerqueira que entrou na UMinho e na Sandra Cerqueira de hoje?
Mudei tanto e foi tão positivo. Era uma jovem com 18 anos, hoje tenho 43. As minhas experiências pessoais e profissionais nestes 24 anos foram essenciais para a construção do meu caminho profissional e permitiram-me estar onde estou hoje. Fizeram parte do meu crescimento enquanto mulher, mãe e profissional. Mas eu quero muito que esta evolução continue!

Tem acompanhado à distância a “vida” da UMinho? O que destaca?
Tenho acompanhado esta extraordinária academia. Sou uma orgulhosa alumna da Escola de Economia e Gestão. Esta universidade presta um ensino de grande qualidade, é uma referência no país e além-fronteiras, tem-se destacado como uma das melhores no ensino superior.



  Perfil

  Uma música. Tenho duas. “You raise me up”, de Josh Groban e “Home”, de Michael Bublé.
  Um livro. É sempre aquele que estou a ler. Atualmente leio “Porque falham as Nações”, de Daron Acemoglu e
  James Robinson.
  Um filme. "Miss Slone - Uma Mulher de Armas", de John Madden.
  Um desporto. Caminhar.
  Um prato. Arroz de tamboril, com gambas e coentros (do meu marido).
  Um vício. Sorrir.
  Uma coleção. Não tenho.
  Uma personalidade. Francisco Sá Carneiro.
  Um momento. O nascimento da minha filha.
  Uma viagem. Todas aquelas que faço com o meu marido e a minha filha.
  Um lugar. Braga.
  Um lema. “The best is yet to come”.
  A família. A minha filha e o meu marido.
  A UMinho. Conhecimento.