Rolls-Royce do curso perfeito
A licenciatura era única em Portugal…
O ímpeto do curso de RI foi excecionalmente bem feito. A UMinho foi buscar os melhores especialistas a países como os EUA e o Reino Unido, para desenharem o Rolls-Royce do que seria o curso perfeito. Vieram até Braga, gostaram dos rojões [risos] e ficaram cá durante semanas a trabalhar no assunto. O programa curricular era de uma qualidade estonteante.
Deixou a sua marca na EEG ao fundar o CECRI, o primeiro núcleo de estudantes da UMinho. Como correu esse processo?
Já existia a tradição dos Colóquios, reconhecidos por todos como algo indispensável à atividade das Relações Internacionais. Mas sentíamos que era necessária uma ação contínua, com oportunidades de contacto de pessoas diversas e de outras áreas científicas. A UMinho estava bastante condicionada em meios. Metade da literatura na nossa área existente na biblioteca era em romeno. A ideia de construir um polo de investigação em RI, que contribuiu depois para a fundação do CECRI, foi do colega Luís Filipe Lobo. Ele queria criar um órgão dedicado à investigação e não propriamente um centro de estudos dinamizado e gerido por alunos. O CECRI surgiu a partir daí, num contexto muito propício, com bases para suprir necessidades identificadas coletivamente.
Houve alguns desentendimentos pelo caminho…
Pois...! [risos] Recordo-me de o reitor Lúcio Craveiro da Silva me "ter puxado" as orelhas ao perceber que tínhamos aparentemente cometido uma ilegalidade irreversível. Isto porque o CECRI foi criado com personalidade jurídica quando tal não era permitido. Foi de certa forma revolucionário, porque esse estatuto permitia-nos receber contributos financeiros e em género, na forma de livros. Passámos a poder ir à Embaixada dos EUA, em Lisboa, por exemplo, mostrar que existíamos e que gostávamos de receber apoios. Em pouco tempo conseguimos organizar várias atividades numa série de áreas. Quando a UMinho percebeu a extensão do “pecado” reagiu com um sorriso um bocadinho agastado, mas não levou aquilo para o lado da sanção. Aliás, se tivesse ficado muito chateada não me tinha dado mais tarde o lugar de professor assistente na EEG.
Começou a trabalhar na Comissão Europeia na altura em que Portugal se juntou à CEE. Tinha acabado o curso há um ano. Como foi a adaptação?
Foi fácil, porque ia muito bem preparado. A qualidade do ensino da UMinho permitiu-me trabalhar facilmente em Inglês e Francês. Em termos de expressão, a maior dificuldade não foi os conhecimentos linguísticos, mas os péssimos hábitos cultivados nas universidades portuguesas de se falar caro e complexo e de escrever frases de quatro linhas e com muitas esdrúxulas. Em Bruxelas, percebi que ninguém se dava ao trabalho de compreender o que dizia. Por isso, comecei a construir frases mais curtinhas e a usar menos esdrúxulas, sobretudo em Inglês e Francês. Em Português ainda me foge o pezinho para a chinela... [risos] Na UMinho aprendi que tudo o que vale a pena ser feito pode efetivamente ser feito. Tudo o que fazíamos era muitíssimo bem feito. Os embaixadores saíam das nossas iniciativas maravilhados, os jornalistas regressavam todos os anos, os alunos faziam perguntas interessantes e os eventos eram bem organizados. Quando cheguei a Bruxelas achei que era assim que se fazia. Dei-me bem com isso.
Já assumiu cargos na área de segurança externa em diferentes países, como Iraque, Rússia, Turquia e Ucrânia. Foi consultor do grupo PESC (Política Externa e de Segurança Comum) e do RELEX (Grupo dos Conselheiros das Relações Externas), além de ter integrado a Direcção-Geral da Justiça, Liberdade e Segurança da CE. É uma vida cheia de desafios. Qual foi a maior dificuldade?
É um trabalho de grande responsabilidade. O serviço público exige uma limitação estatutária e evolutiva da liberdade individual, porque implica pormo-nos ao serviço da coletividade. Nunca deixei de dar a minha opinião e fazer a minha análise. Contudo, se a decisão tomada por quem foi nomeado pelos deputados eleitos pelos povos for no sentido contrário, cumpre-me executá-la, a não ser que viole a lei ou a minha consciência. Isso acontece em qualquer função pública. A diferença é que na CE há mais meios financeiros, bem como de comunicação, informação e recursos humanos.
Há grande capacidade para se fazer mexer as coisas.
Exatamente. Por exemplo, estive no Irão em 1990, depois de um terramoto que matou milhares de pessoas. Já não tínhamos relação com aquele país há dez anos. Por um lado, afigurou-se-me que não se deviam discriminar os iranianos em relação a outros seres humanos na sequência de uma catástrofe semelhante; por outro lado, achei que era uma boa oportunidade para se abrir uma linha de comunicação que poderia ser vantajosa para a UE. O meu diretor achou que os meus argumentos eram de tal forma convincentes que me passou dez milhões de euros para as mãos para construir dois hospitais no Irão.
Foi, entretanto, convidado para trabalhar no Parlamento Europeu. O que tem feito?
Não sou muito de "capelinhas". Estive 30 anos na CE e, em 2007, fui convidado para trabalhar para Portugal enquanto presidente do Conselho da UE. Há cerca de um ano, o Parlamento Europeu pediu à CE que eu fosse destacado para apoiar a Comissão Especial de Terrorismo na elaboração de um relatório sobre políticas de segurança. O relatório é muitíssimo inovador e foi aprovado por maioria. Estou neste momento a ajudar na sua implementação. No dia 1 de junho regresso à CE. Logo verei o que farei a seguir.
|