O SARS-CoV-2 é um alerta para o futuro da humanidade

31-03-2020

Hugo Sousa

Até que ponto estamos preparados? É urgente revitalizar o investimento em saúde e investigação, aumentar a sua diversidade e darmos enfoque na resolução de problemas a nível nacional e internacional. Só assim poderemos ter um país pronto para enfrentar a pandemia sem estarmos expostos aos problemas logísticos globais.


Quando no final de dezembro de 2019 as autoridades chinesas e a Organização Mundial de Saúde começaram a divulgar dados sobre um surto de uma nova doença, estaríamos longe de pensar que tinha acabado de chegar uma pandemia. Atualmente, a pandemia por SARS-CoV-2 atingiu praticamente todos os países do mundo, com mais de 750.000 casos de infeção diagnosticados e mais de 37.000 mortes.

Desde o início do século XXI que assistimos já a várias epidemias e pandemias que têm deixado marcas profundas no mundo. Em 1919, a gripe espanhola causou cerca de 120.000 mortos em Portugal e um número estimado entre 17 e 50 milhões de mortos a nível mundial em pouco mais de 24 semanas. Em 2009, a gripe A causou cerca de 18.000 mortes diretas a nível mundial, apesar de alguns estudos apontarem para um número a rondar as 200.000, visto que apenas foram contabilizadas aquelas em que se procurou o agente responsável. Estes foram alguns exemplos utilizados por muitos epidemiologistas e especialistas de saúde pública para preparar planos de ação para possíveis novas epidemias/pandemias. Mas será que estamos preparados?

Os avanços tecnológicos e científicos dos últimos 100 anos permitiram uma evolução significativa na nossa qualidade de vida e, consequentemente, uma melhoria da saúde. Desde a descoberta dos antibióticos, das vacinas e das novas terapêuticas que fomos capazes de melhorar de tal forma a qualidade de vida da população e conseguimos em pouco tempo aumentar a esperança média de vida dos países desenvolvidos dos 50-60 anos de idade em 1950 para praticamente 80 anos de idade nos dias de hoje. Com os índices de saúde dos países desenvolvidos, seria de esperar que estivéssemos bem preparados para enfrentar epidemias/pandemias que possam surgir, mas a nova pandemia causada pelo SARS-CoV-2 veio expor algumas das fragilidades globais.

Vivemos hoje em sociedades globais, onde a circulação das populações e de bens é constante. Esta circulação facilita a dispersão de agentes patogénicos e torna mais difícil o seu controlo, salvo se o agente for bem conhecido e existam estratégias de prevenção e tratamento eficazes. Esta globalização é um passo extremamente importante na economia e praticamente impossível de se travar (pelo menos a 100%), como se percebe agora.

Atualmente, vivemos tempos de discussão sobre investimento em investigação científica e em saúde e o aparecimento desta nova pandemia traz a nu este problema. Por um lado, não temos investido sempre em reforço dos sistemas públicos de saúde, equipando os hospitais com os materiais e equipamentos adequados para o dia a dia, mas também de forma a que estejam sempre preparados para qualquer ocorrência. Por outro lado, queixamo-nos da não existência de mais testes ou vacinas para este novo vírus.

A velocidade com que vimos a comunidade académica e científica pronta para preparar testes de diagnóstico ou materiais de proteção individual, as empresas têxteis a começar a produzir material de proteção médica, os profissionais de saúde a trabalharem em condições difíceis, mas sem desistir, reflete bem a vontade e a capacidade nacional em resolver problemas de forma rápida e eficaz! Faz parte de nós... sempre que é preciso arregaçamos as mangas e fazemos! Com qualidade! É urgente revitalizar o investimento em saúde e investigação científica, aumentar a sua diversidade e darmos enfoque na resolução dos problemas a nível nacional e internacional, pois só dessa forma poderemos ter um país pronto para enfrentar uma pandemia sem estar expostos aos problemas logísticos globais. É urgente apostar na ciência e na saúde!


Investigador do Domínio de Microbiologia e Doenças Infeciosas do ICVS - Instituto de Investigação em Ciências da Vida e Saúde da UMinho