Retiraremos algo positivo desta experiência digital?

29-05-2020

Rui Oliveira

Neste período, repensamos os nossos métodos educativos e identificamos como fundamental a participação dos estudantes e a revisão do nosso olhar sobre a avaliação. Atrevo-me a dizer que avançamos em três meses o que não fizemos numa década em prol do futuro da educação no ensino superior. 


É certo que o Mundo não será o mesmo depois desta pandemia. Fomos forçados a tomar medidas sem precedentes. As escolas e as universidades mudaram no espaço de semanas aquilo que não mudaram durante décadas. Definitivamente, estes são desafios que nos transformarão. Não podemos ficar presos ao passado, mas também não podemos passar totalmente para os modelos neste ensino remoto.
 
Ainda que daqui em diante me debruce no ensino superior em concreto, creio que a abordagem poderá ser transversal aos restantes ciclos de ensino. Se pensarmos que uma unidade curricular (UC) mantém, durante cinco anos, o seu conteúdo, conseguimos perceber rapidamente que, nos modelos até hoje enraizados, existe um docente que repete a mesma exposição teórica cinco vezes. Em alternativa, o docente poderia simplesmente gravar um vídeo. Um vídeo que seria disponibilizado previamente aos alunos, antes da aula presencial, e serviria como material de suporte à mesma, que se deveria cingir ao debate e à exposição de dúvidas ou à resolução de problemas e casos ou aulas práticas. Desta forma, o docente poderia dedicar mais tempo aos seus projetos de investigação e a um acompanhamento mais personalizado e cuidado dos seus alunos, sendo que estes veriam nas aulas uma oportunidade para desenvolver o seu espírito crítico, através de componentes mais práticas e menos expositivas. 
 
Este modelo exigiria, naturalmente, o que há muito tempo os estudantes defendem: a redução do tempo passado dentro da sala de aula. Que não é, de todo, sinónimo de menos tempo dedicado ao estudo e à aprendizagem. Este é um modelo que permite que os estudantes prepararem os conteúdos letivos nas suas casas, ao ritmo que conseguem acompanhar, repetindo as vezes que assim entenderem. Têm a possibilidade de desenvolver áreas que mais lhes despertem interesse, tendo de existir igualmente espaço presencial para partilharem as suas reflexões e as suas dúvidas com o docente e com os restantes colegas. Desta forma, progridem ao nível da responsabilidade, da autonomia, do espírito crítico, da comunicação, da capacidade de expor os seus problemas e defender os seus pontos de vista, skills fundamentais para alcançar o sucesso académico e profissional.

No que diz respeito à avaliação, é, para mim, hoje, claro que precisamos de uma reforma da visão que temos sobre as mesmas. O que tem sido implementado é uma cultura de finalidade única na avaliação, quando a mesma deve residir na aprendizagem, sendo a avaliação um indicador da mesma, com a necessidade, por isso, de a tornar mais contínua e diversificada.
 
Esta crise evidenciou a necessidade de existência de uma ligação forte nos processos de decisão entre docente e discente, principalmente através da existência e funcionamento das comissões de curso, pela proximidade de comunicação entre alunos e professores na procura de soluções comuns para os problemas que se encontram no dia a dia nos diversos cursos. 

Neste período, repensamos os nossos métodos educativos e identificamos como fundamental a participação dos estudantes e a revisão do nosso olhar sobre a avaliação. Atrevo-me a dizer que avançamos em três meses o que não fizemos numa década em prol do futuro da educação no ensino superior. Estaremos, agora, recetivos a pensar em reformas?


Presidente da Associação Académica da Universidade do Minho