“É importante promover um diálogo interdisciplinar com a sociedade”

29-07-2022 | Pedro Costa | Foto: Nuno Gonçalves

A discursar na 7ª conferência dos 25 anos da FCT, realizada a 26 de julho, no campus de Gualtar, em Braga (foto: Daniel Silva)

Madalena Alves deixa o grupo de investigação no CEB, mas diz que a equipa tem muita maturidade para alavancar os projetos

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Madalena Alves é professora catedrática da Escola de Engenharia e a primeira da UMinho a presidir a Fundação para a Ciência e a Tecnologia, a principal entidade de avaliação e financiamento da investigação em Portugal.


Madalena Alves é licenciada em Engenharia Química pela Universidade do Porto, mestre em Engenharia Bioquímica pelo Instituto Superior Técnico e doutorada em Engenharia Química e Biológica pela UMinho, na qual é professora catedrática da Escola de Engenharia desde 2013 e foi diretora do Centro de Engenharia Biológica (CEB). Pela sua investigação na área da biotecnologia ambiental, recebeu vários prémios nacionais e internacionais, integrou painéis de avaliação de várias organizações e foi representante do Estado português no Conselho do Laboratório Ibérico Internacional de Nanotecnologia (INL). Em 2009 foi distinguida com um doutoramento honoris causa pela Universidade Técnica de IASI, na Roménia. Em 2016 recebeu a medalha de cidadã de mérito pelo Município de Viana do Castelo, de onde é natural. Desde o passado dia 1 de julho tornou-se a nova presidente da Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT), nomeada pelo Conselho de Ministros para um mandato de três anos.
 
 
A nomeação para um cargo de tão alta responsabilidade estava nos seus horizontes ou foi algo de natureza inesperada? 
Foi inesperado, não estava à espera nem ambicionava tal desafio. No entanto, não hesitei em aceitá-lo. Porque gosto de desafios difíceis e pelo facto de o convite ter vindo de uma pessoa com quem tenho muita empatia e que muito admiro, a ministra da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, Elvira Fortunato.
 
Podemos dizer que contribuir positivamente para todo o ecossistema da ciência foi o suficiente para a afastar dos “laboratórios”? 
Sim. Pretendo manter a ligação ao meu grupo de investigação na medida do possível, mas tenho uma equipa de investigação que tem a maturidade suficiente para dar continuidade aos projetos em curso. Além disso, é bom para eles, para a sua autonomia e responsabilização.
 
Quais são os principais desafios que vai encarar este novo conselho diretivo da FCT, que preside?
Imensos desafios, desde logo em relação à própria instituição FCT, onde há oportunidades de melhorias e de modernização. Depois, obviamente que na ciência há grandes objetivos que a FCT terá de cumprir e grandes problemas que terá de resolver. Um exemplo é o da consolidação das carreiras científicas, outro é o da necessidade de captação de financiamento de diversas fontes internacionais.
 
Tem metas já traçadas nos objetivos ou ainda pretenderá atualizar algum diagnóstico da situação presente? 
Estamos a estudar. Acabamos de entrar, precisamos de tempo para estabelecer a estratégia e as prioridades. E, sobretudo, tempo para refletir.
 
A burocracia tem sido apontada como entrave nos mecanismos de apoio. Qual é a sua visão sobre o tema?
É esmagadora, trituradora e paralisante.
 
 


E as diversas fontes de financiamento ou o apontado subfinanciamento da ciência... Estarão no centro das preocupações do seu mandato?
Certamente que sim. A ciência nacional precisa de muito mais financiamento e merece muito mais financiamento do que a FCT tem para oferecer. Há que promover e facilitar o acesso aos fundos europeus e de outras fontes internacionais.
 
Tema difícil para a FCT tem sido o processo das avaliações das unidades de I&D. O que é esperado deste dossiê?
Estamos a avaliar esse dossiê. Teremos que nomear os conselhos científicos que darão apoio à constituição dos painéis de avaliação das unidades e tentaremos criar um processo transparente e justo para todos.
 
A precariedade dos cientistas bolseiros e a perda de talento para mercados mais fortes é outra pecha apontada à ciência portuguesa. Este tema contará com a sua apreciação na FCT? 
Certamente que sim.
 
Como vê o papel da FCT nas eventuais pontes da ciência com a sociedade civil e a economia?
Daremos atenção à cocriação de conhecimento, envolvendo não só os atores diretos da produção científica, mas também as aspirações e as visões de atores sociais. Importa promover uma prática de diálogo interdisciplinar com a sociedade, no cruzamento de fronteiras do saber.
 
O sistema científico português tem evoluído, mas encara uma concorrência internacional cada vez mais competitiva. É possível continuar um caminho positivo de afirmação da ciência nacional num contexto global?
Sim, sem dúvida, mas temos que reinventar o sistema e criar mecanismos ágeis e simples para gerir a ciência. Os cientistas não podem passar muito tempo a fazer não-ciência e esse é um aspeto critico em Portugal, onde se gasta muito tempo em candidaturas malsucedidas, em avaliações, em burocracias desnecessárias e em resoluções de problemas variados. A disponibilidade mental para refletir, ter ideias, executá-las e reportá-las da melhor forma é largamente prejudicada por esse conjunto de entraves.