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O Mundial e o espelho da realidade
24-11-2022
Paulo Salgado
A atenção mediática que o futebol traz permite que se fale, que se revelem factos e que seja um motor para a mudança. O Campeonato do Mundo, para o bem e para o mal, retrata e dá pistas sobre a sociedade em que vivemos.
O Campeonato do Mundo de Futebol 2022 é uma das mais importantes competições desportivas do planeta, capaz de nos fazer evocar memórias, estórias, lendas, golos, fervorosos festejos, lamentações, drama. Um jorrar de emoções, capaz de nos unir numa causa, que nos agarra e nos prende àquele a que muitos apelidam de desporto-rei. É uma espera de quatro anos, para ver os melhores a defender as cores do nosso país. E é por isto que esta é a competição das competições, na qual atletas, federações e marcas querem estar. Uma marca que promove marcas e que tem no seu âmago o melhor que o futebol pode albergar.
Falámos das marcas, como se fossem pessoas, mas elas são um ativo estratégico, no qual, por norma, queremos guardar o melhor e evitar aquilo de que não nos orgulhamos. Se há uma competição entre países para organizar um Mundial, é porque estas nações olham para o Campeonato do Mundo como uma oportunidade, seja de investimento, atrair pessoas, promover o turismo ou gerir perceções – seja imagem ou reputação.
Infelizmente, o sonho – a emoção do desporto no seu estado puro – esbarrou numa realidade de um país (o Catar) que não respeita os Direitos Humanos, que usa e abusa da sua posição financeira para fazer prevalecer os seus interesses e moldar as perceções a seu bel-prazer. Se durante um período se falava de
greenwashing advertising
(aposta em publicidade sobre proteção de ambiente e sustentabilidade, quando a realidade era o oposto), na presente situação estamos perante um
sportswashing
– o uso do desporto para promover a imagem e a reputação e como forma de ocultar outras práticas. A Cerimónia de Abertura foi representativa de mais um destes momentos.
Importa lembrar que a corrupção existiu e que a FIFA, que devia zelar pelo futebol, primeiro vendeu-se, com Blatter, e depois deixou o tema prosseguir, sem mais, numa espécie de “o que está feito, está feito”. E todos nós pouco fizemos no entretanto. Acordámos tarde. Gianni Infantino e a FIFA parecem não ter acordado, tal o teor das declarações e ameaças – a recente polémica sobre o uso de braçadeiras de apoio aos movimentos LGBTQ+ é “só” mais um episódio infeliz.
O único e principal aspeto positivo que consigo retirar é que a atenção mediática que o futebol traz permita que se fale, que se revelem factos e que seja um motor para a mudança. Recordo as palavras do professor António Silva Costa (pioneiro na investigação e ensino da Sociologia e Antropologia do Desporto), que dizia que o desporto é um espelho da sociedade, o Campeonato do Mundo também o é, para o bem e para o mal, retratando e dando pistas sobre a sociedade em que vivemos.
Termino dizendo que, como apaixonado por desporto e futebol, irei festejar Portugal, pois acredito que se há competição que devemos “salvar” das garras de quem não o respeita, é o Campeonato do Mundo (este não é da FIFA). É nosso.
Professor do Instituto de Ciências Sociais da Universidade do Minho
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Nasceu em Esposende há 46 anos. Fez Relações Internacionais na UMinho e concorreu a um estágio no Gabinete de Relações Internacionais, onde acabou por ficar. Foi das nossas primeiras técnicas em mobilidade Erasmus+, em 2008, na Universidade do Chipre. Desde 2017, trabalha na Unidade de Serviços Financeiro e Patrimonial.
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