Desmistificar preconceitos e reaproximar alunos do secundário significa mais procura

29-09-2023 | Daniel Vieira da Silva

Atividades de investigação valem reconhecimento internacional à UMinho

Física é uma das áreas que irá apostar no reforço da comunicação com estudantes do secundário

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Alguns cursos da UMinho estão a reagir a um menor volume de candidatos verificado nos últimos anos.




A Universidade do Minho alcançou excelentes resultados globais no que aos resultados do Concurso Nacional de Acesso (CNA) diz respeito. Os 99,67% de vagas preenchidas enchem de orgulho os responsáveis da instituição, que, fruto da sua exigência, procuram resultados ainda mais positivos. Na 1ª fase do CNA registou-se uma procura acentuada por grande parte dos cursos, algo que contrastou, no entanto, com outras ofertas formativas que não captaram o interesse de tantos candidatos. São, por exemplo, os casos dos cursos de Engenharia de Telecomunicações e Informática, Física, Química, Engenharia Eletrónica Industrial e Computadores, Optometria e Ciências da Visão e Engenharia Têxtil, em que algumas vagas ficaram por preencher.

As candidaturas feitas na 2ª fase do CNA acabaram por atenuar os resultados obtidos na fase anterior. O NÓS procurou perceber de que forma os responsáveis por alguns destes cursos leram os resultados das candidaturas e entender que estratégias estão a ser adotadas nos mesmos para contrariar esta tendência verificada.


Física procura reaproximação e interações diretas no secundário

No caso da Física, licenciatura da Escola de Ciências, o diretor, Bernardo Almeida, explicou que “a pandemia de Covid-19 travou o processo de preenchimento de todas as vagas disponíveis logo na 1ª fase do Concurso Nacional de Acesso” do curso, algo que impôs uma restrição na realização de iniciativas e visitas a escolas, impossibilitando um contacto mais direto com estudantes do ensino secundário". Perdeu-se, na opinião do docente, "a oportunidade de desfazer mitos sobre o curso e de se mostrar as oportunidades que podem existir a quem trabalha na área." No entanto, frisou Bernardo Almeida, esta é uma situação que se pretende reverter, "através da implementação de novas formas de chegar aos potenciais candidatos e da procura de interações diretas, de forma pessoalizada”. "Esse foi um esforço que já se iniciou no ano passado e que dará bons frutos no futuro”, sublinhou.

Bernardo Almeida realçou que existe um espectro largo de saídas profissionais para quem se licencia em Física na UMinho, uma vez que os licenciados “ficam habilitados a desempenhar funções científicas em laboratórios e centros de investigação públicos ou privados, e funções técnicas e de consultadoria em áreas tão diversas como a indústria, empresas da área financeira ou na área hospitalar”. O docente recordou, nesse contexto, o relatório “O desemprego dos diplomados da Universidade do Minho”, de abril de 2019, que mostra que na licenciatura em Física a incidência global de desemprego apresenta valores muito abaixo da taxa de desemprego a nível nacional. “A licenciatura em Física é um curso historicamente com elevada empregabilidade, dando boas perspetivas de futuro aos seus formandos”, garantiu.

O curso segue uma linha central que cobre os principais domínios da Física, proporcionando uma formação solidificada por uma forte componente experimental. Os três percursos possíveis permitem aos alunos uma primeira escolha de uma área específica, sem limitarem as suas opções futuras enquanto licenciados em Física. Um dos percursos traduz-se numa formação focada nas áreas fundamentais da Física. Outra das opções, identificada com um minor em Química, está direcionada para alunos que pretendam seguir uma atividade profissional ligada ao ensino. Por fim, outra via possível é um percurso mais ligado à Física Médica, permitindo uma primeira abordagem dos alunos aos temas e técnicas ligadas a essa área específica.


Têxtil influenciado por oscilações do ciclo económico

No que concerne à Engenharia Têxtil, Graça Soares, diretora do curso, lamentou os resultados obtidos, considerando que os mesmos se devem ao desajustamento entre a perceção que os potenciais candidatos e suas famílias têm face à qualidade de formação que é oferecida na UMinho. A responsável reforçou que “o curso oferece um potencial inovador e de empregabilidade” e que está a ser impactado negativamente pela “caixa de ressonância de toda a publicidade negativa difundida pelos media sempre que o ciclo económico é menos favorável”.

“A licenciatura em Engenharia Têxtil é única [no país] e insere-se na área de engenharia de materiais, mas com saídas profissionais que vão muito para além das oferecidas pelo setor industrial têxtil, sem desemprego, começando já os nossos alunos a serem aliciados pelas indústrias a trabalhar antes de terminarem a sua formação académica”, frisou a docente. Avançou ao NÓS que já foram tomadas medidas para mitigar o desfasamento entre as expectativas dos estudantes do secundário e as dos responsáveis do curso na UMinho: “Foi feito um planeamento estratégico considerando o horizonte de 2030, assente em cinco eixos - infraestruturas, alumni, comunicação e marketing, empresas, recursos humanos e oferta formativa”, enumerou Graça Soares. Salientou que será formalizada “a criação de pools de empresas nas diferentes áreas de atuação da têxtil, não só como parceiros efetivos das atividades de investigação, mas também na tarefa de abrir as suas portas à formação feita na UMinho”.

A licenciatura da Escola de Engenharia forma profissionais para integrarem um importante setor de atividade da cadeia de valor têxtil e vestuário de uma forma transversal. Estes destinam-se a um espectro muito amplo de empresas, desde os produtores de têxteis a outros setores industriais que incorporam os têxteis na produção, incluindo os têxteis técnicos. Os setores de atividade em que atuam variam entre os têxteis para vestuário “convencional” e funcional, até aos têxteis para aplicações técnicas e industriais.


Saídas profissionais menos conhecidas afastam estudantes da Química

No caso da licenciatura em Química, a diretora, Ana Paula Esteves, afirmou não ter uma explicação objetiva para a baixa procura pelos cursos na área da Química, mas entende que a situação pode ser, em parte, “devido ao desconhecimento por parte dos estudantes do ensino secundário das variadíssimas saídas profissionais que uma licenciatura em Química proporciona”. Neste particular, a UMinho acabou por acompanhar uma tendência que se verificou em grande parte das instituições de ensino superior nacionais.

Apesar de a formação adquirida pelos licenciados em Química permitir o acesso a uma grande diversidade de saídas profissionais em indústrias e serviços, com destaque para as incursões na indústria química, farmacêutica, agroquímica, petroquímica, alimentar, têxtil, papel, cortiça, cosmética, polímeros, tintas, entre outros, os números da 1ª fase do CNA não foram animadores. “Penso que a ideia dos estudantes está muito 'formatada' no sentido de que uma licenciatura em Química é direcionada para a profissão de professor”, explicou a docente do Departamento de Química. Considerou que a alteração de paradigma pode passar por uma “alteração de mensagem que é difundida pelos professores de Química dos ensinos básico e secundário, motivando os estudantes e aconselhando as suas opções com vista à escolha de uma carreira futura nesta área”. Contudo, sublinhou a necessidade de atrair para a profissão os professores mais capazes e motivados de entre as gerações mais jovens, de forma a que estes se sintam motivados a partilhar boas experiências com os estudantes do básico e secundário.

A reação na UMinho, em algumas das suas licenciaturas, faz-se sentir face às expectativas que saíram defraudadas no último Concurso Nacional de Acesso. A aposta num maior fluxo e melhor comunicação junto dos estudantes do secundário é uma aposta que parece ser transversal às várias áreas de ensino mais impactadas e na UMinho esse caminho já começou a ser trilhado. Até porque menor procura não significa, de todo, menor qualidade.