Objetos com história: o esfigmomanómetro

28-03-2024 | Nuno Passos | Fotos: Nuno Gonçalves

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No Cinquentenário da UMinho, estamos a conhecer artefactos que fazem parte da nossa história.




A Escola Superior de Enfermagem (ESE) da UMinho, no campus de Gualtar, em Braga, tem no seu corredor principal uma vitrine-museu que é uma incrível viagem do tempo naquela profissão. Alguns instrumentos têm tanto de sedutor como grosseiro: o relógio de enfermeiro, o otoscópio, o medidor de albumina, o pó de talco e o expeturador em metal, os inúmeros frascos e tubos de ensaio, a lamparina de vidro para esterilizar/aquecer, os manequins de anatomia com órgãos que (des)encaixam, o painel das aulas sobre gravidez, o projetor de slides e livros (epidiascópio), o suporte dos equilíbrios hidroeletrolíticos, os livretos obrigatórios e sobre a primeira enfermeira Florence Nightingale, a lamparina-símbolo que acompanha os alunos à missa anual no Sameiro, as muitas condecorações desta Escola criada em 1912…
 
“Vê estas seringas de vidro? Ainda trabalhei assim no hospital e havia-as de vários calibres, a de insulina era das mais pequenas, por exemplo”, mostra a presidente da ESE, Esperança Gago, com a emoção de quem adora o que faz. Ao lado há um paralelepípedo aberto, em metal, outrora usado para ferver as seringas, separadas do êmbolo, e as suas agulhas, que encaixavam com um adaptador. “Tudo era fervido no mínimo 15 minutos, para evitar infeções”, detalha. Havia até afiador para bicos das agulhas, quando ficavam mais rombas e para não se magoar o paciente. E a agulha em curva, como um anzol, servia para suturar a pele. “Agora é quase tudo descartável, de uso único, embora os princípios sejam os mesmos”, acrescenta.
 
Mas o ex-libris da vitrine é um esfigmomanómetro (nome técnico para medidor de tensões arteriais) mais velho do que a própria Escola, mas bem preservado. A tampa da sua caixa preta guarda a rubrica do médico e cientista alemão Heinrich von Recklinghausen, que em 1901 aperfeiçoou o mecanismo antes criado pelo austríaco Samuel von Basch e melhorado pelo italiano Riva-Rocci. Como funciona? Uma “pera” de borracha insufla a braçadeira, colocada dois centímetros acima da dobra do braço do paciente, e essa compressão impede o bombear de sangue da principal artéria do braço. O enfermeiro vai então aliviando a pressão da braçadeira e o primeiro som que ouve no seu estetoscópio é a artéria adescomprimir para fazer fluir o sangue: eis a tensão arterial máxima (sistólica).
 
“Requer grande atenção entre o que o enfermeiro ouve e o que vê no visor do medidor, para registar se a agulha apontou nesse momento no 13, 12, 11... Depois, continua a aliviar a pressão da braçadeira até deixar de ouvir o som no estetoscópio, do fluir do sangue arterial – este segundo valor que é observado identifica a tensão arterial mínima (diastólica)”, descreve Esperança Gago. A ausência de som significa a abertura total da artéria e que o sangue voltou a circular naturalmente.






A eletrónica acelera e autonomiza a medição

“Fez-se assim durante muitos anos, até surgirem os aparelhos eletrónicos, que dão logo o valor mínimo e máximo no visor”, frisa. O cidadão pode hoje fazer a sua avaliação e a lógica é igual: a braçadeira comprime a artéria, depois liberta-se o ar e o aparelho deteta o primeiro batimento. “É curioso”, sorri Esperança Gago, “não cheguei a usar este valioso esfigmomanómetro quando fui aluna há 44, 45 anos nesta Escola”. Em vez disso, tinha um que cabia na bolsinha: enfermeira que se preze tem sempre um medidor à mão. Também usava outro que, ao insuflar o ar, fazia subir uma coluna de mercúrio para certo valor, num princípio similar ao da agulha de von Recklinghausen.
 
A Escola Superior de Enfermagem (que seria integrada na UMinho em 2004) ficava então junto do antigo Hospital de São Marcos e chamava-se Calouste Gulbenkian, nome do mecenas que financiou a sua construção. Ao lado havia um lar (hoje, de idosos) para o internato de quem fazia o curso de Enfermagem. Era uma profissão predominantemente feminina e elas não podiam ir para casa nem andar pelas ruas. Os tempos felizmente mudaram e há, também, cada vez mais jovens enfermeiros.