Foi concebida na
Escola de Psicologia da Universidade do Minho uma técnica pioneira que ajuda as testemunhas e vítimas a recordarem com maior precisão o sucedido no local do crime. O método chama-se ‘Recordação por Categorias’ e tem despertado a curiosidade de peritos a nível internacional. Consiste em pedir às testemunhas que, após um primeiro relato, descrevam isoladamente as pessoas envolvidas, depois as ações, os locais, os objetos, os diálogos, os sons. O investigador Rui Paulo defende que esta técnica de entrevista aumenta as memórias relatadas pelas testemunhas e desperta a sua atenção para “pormenores esquecidos”.
O
trabalho levado a cabo por Rui Paulo no âmbito do seu doutoramento revela que mais de 90% da informação relatada nos estudos realizados estava correta, o que demonstra uma precisão no relato muito elevada. “Nenhuma estratégia permite alcançar uma representação exata da realidade. A memória não é perfeita, por isso é natural que haja falhas quando alguém descreve um acontecimento. Este método mostrou ser mais eficaz do que outros usados na prática forense (por exemplo: mudança de ordem e mudança de perspetiva), pois possibilita a obtenção de muita informação sem que os erros aumentem”, explica o psicólogo, agora a dar aulas na
Universidade de Bath Spa, no Reino Unido.
Na ausência de provas 100% conclusivas, como o ADN e as impressões digitais, os testemunhos assumem um papel fundamental na resolução do caso. Daí ser importante encontrar estratégias que permitam alcançar relatos mais próximos da realidade. A responsabilidade recai no inspetor que deve usar técnicas que ajudem a vítima a recordar o máximo de detalhes possível sobre o crime, evitando interferir em demasia na entrevista e induzir as respostas. “Isso nem sempre acontece e muitos dos erros cometidos pelas vítimas no interrogatório decorrem de procedimentos desajustados ainda hoje adotados pelas forças policiais”, assevera Rui Paulo, que colabora com o Grupo em Memória Humana do Centro de Investigação em Psicologia (
CIPsi) da UMinho. Por exemplo, a realização de interrogatórios semelhantes para todas as testemunhas e focados maioritariamente em questões diretas como ‘De que cor era a arma do assaltante?’ distorce a resposta do entrevistado, ao sugerir que o criminoso tinha uma arma.
Eficácia já foi comprovada por cientistas de vários países
A eficácia do método “Recordação por Categorias” deve-se ao facto de este ter sido construído tendo como base o funcionamento da memória humana e o modo como a informação é codificada e armazenada. Os resultados foram recentemente publicados nas revistas “Applied Cognitive Psychology” e “Psychology, Crime and Law”. Solicitar à testemunha que descreva o crime focando isoladamente categorias de informação, como objetos (sofá, cadeira, mesa), tende a ativar memórias associadas que não seriam provavelmente recordadas se a estória fosse contada cronologicamente. Desde que o primeiro artigo científico foi lançado em 2017, investigadores de vários países testaram a sua eficácia com sucesso. “É extremamente gratificante, pois este é o primeiro passo para que a nossa técnica possa ser utilizada na prática forense”, conclui Rui Paulo, que contou com o apoio dos docentes Pedro Albuquerque (UMinho) e Ray Bull ( Universidade de Leicester, no Reino Unido).
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