Relevância das fortificações na raia do Minho dá origem a documentário

31-03-2021 | Daniel Vieira da Silva

Rebeca Blanco-Rotea é pós-doutoranda do Lab2PT da UMinho, arqueóloga da Universidade de Santiago de Compostela e coordena a investigação que dá origem ao documentário

A investigação envolveu também a Unidade de Arqueologia da UMinho e o arqueólogo Luís Fontes

O produtor Marcos Nine em gravações no Extremo, nos limites do concelho de Arcos de Valdevez

Estudantes de Arqueologia da UMinho num momento de prospeção no terreno

Momento de preparação para sondagens realizado pela equipa de arqueólogos e estudantes da UMinho

Trabalhos arqueológicos em curso nas fortificações da raia do Minho

Momento da assinatura do protocolo entre a Unidade de Arqueologia da UMinho e a Câmara Municipal de Arcos de Valdevez

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Investigação da arqueóloga Rebeca Blanco-Rotea, do Lab2PT, conta com apoio da UMinho para ganhar expressão em vídeo.


Apresentar as fortificações na fronteira entre o Norte de Portugal e a Galiza, a par da sua relevância histórica e social, é o objetivo de um documentário que deverá estar concluído até ao final do ano. Tem como base a investigação levada a cabo por Rebeca Blanco-Rotea, pós-doutoranda do Laboratório de Paisagens, Património e Território (Lab2PT) da Universidade do Minho e arqueóloga do Grupo de Investigação Síncrisis da Universidade de Santiago de Compostela (USC), que procura explicar e perpetuar a importância daquelas estruturas da raia.



“É através dos vestígios materiais que fazemos conexões entre a nossa realidade e o que éramos noutra época." Rebeca Blanco-Rotea não tem dúvidas que essa função social aliada à sua atividade não pode estar desligada da investigação produzida pelos arqueólogos, seus pares. Envolvida em mais de 50 projetos arqueológicos e ligada à Unidade de Arqueologia da UMinho (UAUM) entre 2016 e 2018, a investigadora tem ao longo dos últimos anos estudado as fortificações na fronteira entre a Galiza e o Norte de Portugal, “um património complexo”. Em Portugal, a construção destas estruturas foi associada à restauração da independência do reino, após várias décadas de anexação ao império hispânico.

“O património fortificado preservado em Extremo [Arcos de Valdevez] é excecional, não só aquele que pode ser visto, mas também aquele que está escondido e que trouxemos à luz através do nosso projeto”, diz em entrevista ao NÓS. Rebeca Blanco-Rotea e restante equipa consideraram que abordar o tema em texto não iria suscitar o interesse social que o projeto deveria suscitar, daí terem avançado para a ideia do documentário, “que permite jogar com imagens e palavras”. “Se o fizermos com a ajuda da comunidade local, podemos levá-los a identificarem-se plenamente com este património, podemos mesmo ajudar o património a tornar-se uma força motriz para o desenvolvimento sustentável”, afirma.


Fortificações, paisagem e pessoas
 
O documentário irá trabalhar três áreas distintas que serão cruzadas entre si. As fortificações são o elemento patrimonial do qual a ideia deriva, a paisagem é o pano de fundo (e que melhor cenário do que as próprias serras da Boulhosa e Pereira?) e as pessoas são o foco prioritário. O trabalho em vídeo não terá apenas a visão de uma arqueóloga sobre os três elementos. "Foi essencial criar uma linguagem cinematográfica, daí a escolha da cineasta Sara Traba para desenvolver este projeto. Dei-lhe uma história e ela deu-lhe forma. Eu sozinha não seria capaz de captar essa sensibilidade por detrás da câmara”, explica a arqueóloga, que considera este documentário “um instrumento muito útil no processo de comunicação que interessava estabelecer”.
 
“Tudo o que o documentário mostrar baseia-se em anos de investigação. Com ele procuramos estabelecer uma ligação com a comunidade onde este património se encontra e, em segundo lugar, com as populações circundantes. Estamos convencidos de que o património fortificado da raia, mas também a sua paisagem, são um recurso turístico, cultural e económico da primeira ordem, mas quem tem de o ver primeiro são as comunidades que o possuem - tentamos envolvê-las e alcançá-las com esta linguagem” sublinha a arqueóloga. O documentário conta com a colaboração da UMinho e o apoio logístico da Câmara Municipal de Arcos de Valdevez, sendo financiado pelo projeto de pós-doutoramento de Rebeca Blanco-Rotea, desenvolvido na USC.


Trailer d'"A festa do emigrante", de Sara Traba, dedicado ao lugar do Extremo, Arcos de Valdevez
O documentário "A Festa do Emigrante", dedicado ao lugar do Extremo, Arcos de Valdevez, já tem teaser



  Documentários, cinema e... banda desenhada

O grupo de investigação Sincrísis, do qual Rebeca Blanco-Rotea faz parte, encontra-se também a rodar a curta-metragem “A Guerra do Extremo”, que recorre à banda desenhada. “Um dos objetivos do nosso trabalho no local era a valorização e a socialização do mesmo e propusemo-nos a fazê-lo mostrando como a guerra tinha tido lugar nesta área da serra. O meu grupo de investigação decidiu fazer uma série de vídeos informativos do trabalho que nele estávamos a desenvolver a partir de diferentes linhas de investigação e, no meu caso, decidimos fazer esta proposta, que também combina as imagens da paisagem atual com uma banda de desenhada, com motion graphic”, explica. O trabalho está a ser dirigido por Marcos Nine e conta com a colaboração do arqueólogo Luís Fones, da UAUM, e do município arcuense.
 
Rebeca Blanco-Rotea está também envolvida na organização do “Ciclo de Cinema Luso-Galego”. A iniciativa é promovida pelo Consello da Cultura Galega (do qual Rebeca é membro do plenário), em colaboração com a Reitoria da UMinho, o Centro de Estudos Galegos da UMinho e a Secretaria Geral de Política Linguística da Xunta de Galicia. Apesar de não se ter realizado em 2020 devido à pandemia, pretende-se que a edição deste ano seja em Arcos de Valdevez, com apoio da autarquia: “Está previsto para setembro e estamos a trabalhar no desenvolvimento do programa. Se tudo correr bem, esperamos estrear ali 'A Festa do Emigrante'”. Esse é o título do documentário que Rebeca-Blanco-Rotea decidiu avançar em meados de 2019 com a realizadora Sara Traba, porque “os resultados da investigação desenvolvida no Extremo poderiam continuar a ser valorizados” dessa forma.
 


Uma ligação com quase duas décadas
 
A arqueóloga trabalha desde 2003 nesta paisagem fronteiriça e em 2015 apresentou a sua tese de doutoramento 
sobre o tema. Um ano mais tarde iniciou um projeto de pós-doutoramento da Xunta de Galicia e chegou à UMinho, mais concretamente à UAUM, onde durnte dois anos trabalhou mais diretamente a “metade portuguesa” das fortificações. Esta abordagem foi acompanhada nos vários centros de investigação em que colaborou - UAUM e Lab2PT na UMInho, Instituto de Ciencias del Património e Síncrisis em Espanha.

Esse projeto deu origem a um protocolo assinado entre a Reitoria da UMinho e o Município de Arcos de Valdevez que contemplava várias sondagens, prospeção arqueológica, trabalhos de teledeteção, levantamentos e, já na fase final, produção de materiais para a valorização desses fortes. A investigação envolveu, através de estágios, os estudantes da licenciatura e mestrado em Arqueologia da UMinho. O plano de trabalho foi coordenado por Luís Fontes.